Na florada do ipê amarelo, por exemplo, transparecem alegria e elegante formosura. Assemelha-se ele a uma árvore ornada de magnífico manto dourado, conferindo um ar de corte onde se encontra. São sóis que reluzem em meio ao verde da mata, e suas flores reunidas em cachos de ouro estão a nos transmitir uma mensagem de esperança no porvir, nas promessas de Deus ainda não realizadas, mas que se cumprirão a seu tempo.
Já o ipê roxo, quando floresce, apresenta uma beleza de suave tristeza e doce acolhimento, como a nos consolar, convidando-nos a estar debaixo de sua copa protetora. Lembra-nos a Paixão de Jesus, e nos ensina que esta vida é de luz, mas também de cruz.
Os ipês brancos, por sua vez, parecem nuvens, com seus flocos de uma tal alvura que nunca se deixam manchar. Evocam-nos os Anjos a esvoaçar ou, mais ainda, a pureza celestial de Maria, Virgem Imaculada.
Um prelúdio da Visão Beatífica
Nesta terra, podemos conhecer a Deus pelos reflexos de suas perfeições postas nas criaturas, seja na natureza, seja sobretudo nas almas dos justos, através de seus exemplos e palavras. Só na glória eterna O veremos diretamente, tal como Ele é. Por isso diz São Paulo que na vida terrena nós vemos a Deus como por um espelho, em enigma; mas no Céu O veremos face a face (Cfr. I Cor 13,12).
Esse ver a Deus nos seus reflexos já é o prelúdio da vida que teremos no Céu. Se estes lindos ipês tanto nos encantam, qual não será nossa felicidade ao contemplarmos Maria Santíssima a obra-prima da Criação? O ipê branco bem poderia simbolizar a Virgem Maria em sua Imaculada Conceição; o dourado, a sua Maternidade Divina; e o roxo, a sua Co-Redenção do gênero humano.
Saudades da inocência
Diz o Gênesis (2, 8-9) que Deus plantou um Jardim de delícias e pôs nele o homem, com toda espécie de árvores formosas à vista. Não podemos, então, imaginar que os ipês já tenham existido no Éden, e Deus os mantém nesta terra para nos fazer sentir saudades do Paraíso perdido?
Vemos tantos poetas e literatos escreverem a respeito das saudades de sua infância, dessa fase da vida em que as dificuldades, as decepções, os desastres e os horrores deste mundo de exílio não se haviam apresentado ainda. Vem-nos naturalmente à lembrança a poesia de Casimiro de Abreu:
“Ai que saudades que tenho da aurora da minha vida,
De minha infância querida,
Que os anos não trazem mais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
O mundo é um sonho dourado,
A vida, um hino de amor!”
Será que o caro leitor também não terá experimentado essas saudades, num certo momento de sua vida? Cada um dirá…
Na época da infância, tudo é diferente, dourado, bonito, bom e delicioso. A criança, em geral, tem aquela singeleza, inocência e generosidade que a faz entusiasmar-se pelas coisas belas, que serão ora desenhos de nuvens num céu azul, ora figuras coloridas, ou ainda a narração de bonitas histórias.
Este ver assim não é uma ilusão de estar num mundo de fantasia, irreal, mas é a realidade vista com os olhos da inocência e da fé. Por isso diz-nos Jesus: “O reino dos Céus é para aqueles que se assemelham às criancinhas” (Mt. 19,14).
A beleza salvará o mundo
Essas considerações nos fazem melhor compreender a afirmação do Papa João Paulo II, na Carta aos Artistas: “A beleza salvará o mundo”.
Pois são as belezas criadas que nos abrem os olhos para os esplendores divinos e fazem nascer em nós aquelas “saudades” de Deus, a própria Beleza incriada, que levou Santo Agostinho a exclamar, em suas Confissões: “Tarde te amei, formosura tão antiga, e tão nova. Tarde te amei. Tu estavas de dentro, e eu de fora, e ali te buscava; e eu feio ia em seguimento desta formosura visível, que tu fizeste. (Revista Arautos do Evangelho, Ag/2004, n. 32, p. 50-51)