“O que se sabe de Simão senão que era de Cirene, e o que se sabe de Cirene senão que era a terra de Simão?” Com estas palavras, Dr. Plinio abre seu comentário à quinta meditação da via-sacra por ocasião da Semana Santa. Hoje vamos ver que Simão Cirineu é um personagem que tem muito a nos ensinar.
No Evangelho da paixão lido neste Domingo de Ramos, ouvimos São Lucas nos contar: “Pilatos, então, soltou o homem que eles queriam – aquele que fora preso por revolta e homicídio – e entregou Jesus à vontade deles. Enquanto levavam Jesus, pegaram certo Simão, de Cirene, que voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus”. (Lc 23, 25-26).
Desta passagem descobrimos que Simão era um campestre, provavelmente pouco versado na literatura Sagrada, e que estava alheio ao tumulto que se dava diante do palácio. Não era uma pessoa importante, com vestimentas clássicas ou posição prestigiosa, senão não seria um escolhido para carregar a cruz de um criminoso. Considerando que Jesus começou a carregar sua via dolorosa ainda na parte da manhã, sendo que meio-dia seria crucificado e às três expiraria, Simão deve ter acordado ainda de madrugada para cultivar o campo e já voltava de seu turno laboral.
Mais que isso, não podemos saber. As informações em todos os evangelistas são apenas estas, e Simão Cireneu surge na história como um anônimo, e, se não fosse por seu encontro com Cristo, teria imergido nela de volta também como um desconhecido.
Cristo foi tachado como um malfeitor diante do povo que procurou curar. Diante do Senhor - muitos padres e religiosos afirmam isso - estavam aqueles coxos, paralíticos, cegos, leprosos que Ele tanto ajudou, seja curando suas mazelas, seja lhe dando direito de serem inseridos de novo em suas comunidades.
Simão voltava do campo. Ou seja, não estava presente no tribunal da ingratidão, mas também não prestava apoio ao Redentor que sofria. Não fora agraciado com nenhum milagre, muito provavelmente porque não sofria nenhuma deformidade. Era o que chamaríamos de meio-termo: não perseguia a Cristo, mas também não tinha parte com ele.
Durante três anos Jesus pregou por toda Galileia e toda Judeia, sempre acompanhado de enormes e prodigiosos portentos. Como não terá ouvido Simão falar do Mestre? Numa época onde a informação não era tão repartida, dado as condições, as notícias de um nazareno que desafiava aos fariseus, que lhes deixava sem respostas, e trazia uma nova perspectiva de vida, sobretudo aos que sofriam, devia ser muito empolgante.
Portanto, Simão em algo devia saber da fama de Jesus. Sabia, mesmo que superficialmente, dos tumultos de Jerusalém: Cristo havia entrado no domingo passado aclamado como um rei, e toda a cidade cantava seus louvores. Mas ele não estava lá.
Qual sua surpresa, então, quando alheio propositalmente a tudo, se viu colocado na extremidade da cruz do Salvador? Já todo chagado, todo ferido, cansado. E qual não foi o olhar que Cristo lhe dirigiu? O que terá feito na alma de Simão, o Cirineu? Isso teremos que deixar para o Juízo Final, quando saberemos tudo de todos, e veremos, como numa tela, a cena de Simão Cirineu ajudando Nosso Senhor com sua cruz.
Que lição Simão de Cirene nos dá, mesmo mais de dois mil anos depois de sua atuação no acontecimento mais importante da História?
A primeira: Deus não se esquece de nós, por mais que muitas vezes esqueçamos dele. Em nossa vidinha, em nossa rotina, em nossa jornada diária, não há espaço para o Senhor dos Milagres, na maioria dos momentos porque não precisamos deles, ou pelo menos julgamos que não. Mas é num cruzamento perigoso, é num quarto de hospital, é na dor de uma mãe pelo filho ou vice-versa, que Cristo olha para nós e diz: “quereis ser meu Simão Cirineu? Não quereis me ajudar a carregar minha Cruz?” E é necessário pedir a Nossa Senhora generosidade de alma para aceitar estes convites de Deus.
A segunda lição é uma parte da primeira: com certeza, não foi Simão quem ajudou Jesus, mas sim Nosso Senhor que ajudou o Cirineu. No olhar que ambos cruzaram, Simão deve ter entendido. Compreendeu que cruz todos nós devemos carregar. Porém, é nossa escolha convidar a Cristo e caminhar com Ele ou não.
Rezemos a Deus que Simão Cirineu tenha sido fiel a seu chamado e hoje esteja a reluzir no Céu, junto dos santos. E que nós aprendamos dele a lição que nesta Semana Santa meditaremos: a santidade passa pela Cruz.