Enviado pelo pai - também chamado Tobias - a uma terra desconhecida, o jovem viajante pediu a um desconhecido que o acompanhasse, o qual era um Anjo que assumira aspecto humano e que dissera conhecer o caminho. Tobias, além de cumprir a missão, retornou com um remédio para curar a cegueira que seu genitor adquirira em um acidente.

Recobrada a visão, pôde o velho Tobias ver a esposa do filho - que se casara na viagem - e as riquezas trazidas no retorno. E, para surpresa de todos, no momento dos agradecimentos, o guia da viagem revelou-se como sendo o Arcanjo Rafael. 

São Rafael é atualmente considerado como o padroeiro dos viajantes.

A história de Tobias com o Arcanjo Rafael

O reino de Israel durou duzentos e cinquenta e quatro anos, e teve dezenove reis, todos ímpios. Frequentemente, Deus mandou-lhes profetas para admoestá-los e levá-los a eles e a seus súditos à prática do verdadeiro culto, mas inutilmente. As ameaças dos profetas foram desprezadas e os mesmos profetas foram encarcerados, exilados ou mortos. Tan­tas iniquidades esgotaram a misericórdia do Senhor, que entregou o povo e o rei de Israel nas mãos de seus inimigos. O último rei de Israel foi Oséias, sob cujo governo teve fim aquele reino.

No princípio, ele tentou libertar-se do jugo dos assírios, de quem se tinha tornado tributário; mas, indignado, Salmanassar, rei da Assíria, marchou com poderoso exército para expugnar Samaria. Depois de três anos de cerco, apoderou-se da cidade, prendeu Oséias e meteu-o a ferros. Depois de submeter todo o reino ao seu poder, levou o rei e o povo para a Assíria e para a Média, de onde não mais voltaram.

Os israelitas na Assíria

Os Israelitas padeceram na Assíria duríssima escravidão; muitas vezes faltaram-lhes um pedaço de pão para matarem a fome e um trapo para se vestirem. Muitos foram assassinados e seus cadáveres atirados fora dos muros da cidade para servirem de pasto às aves de rapina e a outros animais ferozes, sem que se lhes pudesse dar sepultura, sendo isto proibido por uma lei desumana. Assim, aquele povo, que fora surdo aos repetidos avisos dos profetas do Senhor, pagava o duro preço de suas infidelidades. 

Deus, que é sempre bom, mandou um consolador aos pobres israelitas. Foi o piedoso Tobias, homem educado no Santo temor de Deus, grandemente estimado pela sua piedade e paciência.

Levado ao cativeiro com os outros, à vista de seus irmãos oprimidos, dedicou-se ao Santo mister de consolar os aflitos, de alimentar e vestir os necessitados e sepultar os mortos. Quando sabia que um Israelita morto era atirado em qualquer canto, deixava o que estava fazendo e aproveitava da escuridão da noite para enterrá-lo.

O rei cruel, tendo notícia de semelhantes fatos e de como Tobias dispensava seus bons ofícios aos seus irmãos de exílio, mandou que fosse espoliado de todos os bens e condenado à morte. Apesar disso, o Senhor conservou-lhe a vida: fugindo à cólera do rei, ficou escondido por algumas pessoas piedosas, em companhia de sua mulher e seu filho.

Pouco depois, tendo sido assassinado esse rei cruel, pôde Tobias continuar no desempenho de seu piedoso mister. Um dia, tendo-se sentado à mesa para jantar, veio seu filho adverti-lo de que haviam deixado na praça um cadáver. Levantou-se imediatamente da mesa, foi buscar o cadáver e o ocultou em casa, sepultando-o depois durante a noite, mostrando assim quanto era constante e qual o seu ardor no exercício da caridade.

A virtude de Tobias

A virtude de Tobias foi experimentada por Deus com grandes tribulações. Uma ocasião, após ter passado a noite inteira a dar sepultura aos mortos, voltava para casa ao clarear do dia, e prostrado de cansaço, deitou-se perto de um muro sobre o qual havia um ninho de andorinhas, e ali adormeceu. Durante o sono caiu-lhe nos olhos um pouco de cisco quente do ninho daqueles passarinhos e ficou cego.

Nesse mísero estado, conservou-se sempre fiel ao Senhor. Nada temia tanto como o pecado e até a sombra dele. Sua mulher, que o sustentava com o seu trabalho, levou para casa um dia um cabrito que lhe haviam dado como pagamento. O cego, ouvindo-o berrar, disse: Vê lá que esse cabrito não tenha sido roubado! Se o foi, mulher, volta imediatamente a restituí-lo ao seu dono. Não devemos lançar mão da mínima coisa pertencente aos outros.

Recomendações de Tobias

Oprimido por tantas desventuras, Tobias pediu ao Senhor que o chamasse à outra vida. Supondo que Deus ouvira o seu pedido, deu ao filho estas lembranças:

"Meu filho, recomendo-te que respeites sempre tua mãe e nunca te esqueças do que ela sofreu por ti. Não se apague em tua mente a imagem de teu Deus e guarda-te do pecado e de fazer algo contra os Mandamentos divinos. Tem compaixão dos pobres e Deus terá compaixão de ti. Faze esmola; se tiveres pouco, desse mesmo pouco dá o que puderes, mas dá de boa vontade. A esmola apaga os pecados, faz achar misericórdia diante de Deus e conduz à vida eterna. Nas dúvidas, aconselha-te com homens prudentes, mas não te associes nunca aos perversos. Foge da soberba e preserva-te da impureza".

O filho, todo comovido, respondeu-lhe: "Meu pai, farei tudo quanto me disseste". E manteve fielmente a sua promessa.

Tobias manda seu filho a Rages acompanhado por Rafael

O bom Tobias não morreu então, como supunha. O Senhor conservou-lhe a vida para fazê-lo gozar inefáveis consolações, por meio de seu filho chamado também Tobias. Um dia, disse o velho a seu filho: Tobias, emprestei dez talentos de prata a Gabel, que reside em Rages, cidade da Média. Eis o documento relativo. Apresentando-lho, ele te restituirá logo o dinheiro. Mas, como tu não sabes o caminho, vai procurar algum amigo fiel que te possa guiar.

O filho obediente saiu de casa e encontrou um jovem prestes a empreender uma viagem. Ignorando que o desconhecido fosse um Anjo de Deus, disse-lhe delicadamente: "Bom jovem, quem és tu?" Conheces a estrada que conduz à Média? E o jovem respondeu: Eu sou israelita e conheço bem o caminho de que falas, pois morei muito tempo em Rages, na casa de Gabel. Tobias, com o consentimento do pai, partiu com o Anjo Rafael, que disfarçado sob aparência humana e sem se dar a conhecer, prontificou-se a acompanhá-lo.

Chegando à margem do Tigre, um peixe monstruoso atacou o jovem Tobias, e já parecia que ia devorá-lo, quando o Arcanjo Rafael lhe disse que não temesse e que segurasse o peixe, o matasse e lhe tirasse o fígado, com o qual faria um remédio para curar o pai.

Uma viagem iniciada sob tão bons auspícios não podia terminar senão próspera e feliz. E de fato, o Anjo não só fez com que Tobias recebesse o dinheiro que fora buscar, como também procurou e conseguiu que o mesmo desposasse uma rica e virtuosíssima donzela de nome Sara, filha única de Raguel.

Volta do filho. Cura e Santa morte do pai

Entretanto, Tobias e sua mulher esperavam ansiosos pela demora. Muitas vezes, a mãe, do alto de um monte, procurava impacientemente ver se o descobriria ao longe. Por muitos dias, foi vã a sua expectativa. Finalmente avistou-o um dia e, satisfeitíssima, correu dar a boa nova ao marido. O velho Tobias, apesar de cego, quis ir ao encontro do amado filho. Os pais o abraçaram com ternura. Isto era apenas o início das grandes consolações que a bondade divina ao velho Tobias queria conceder.

O jovem Tobias unge os olhos do pai com o fel do peixe, e o velho imediatamente recupera a vista, e pode ver, não somente o filho amado, mas ainda observa a esposa, admira suas singulares qualidades e as grandes riquezas que trouxera consigo.

Espalhada a notícia da volta do filho de Tobias e de como o bom pai tinha sido curado, seus parentes se reuniram para dar graças ao Senhor e festejar o acontecimento. Em presença de todas essas pessoas, enumerou o filho os solenes benefícios que havia recebido do companheiro de viagem, que ainda julgava ser um homem.

O Anjo Rafael deu-se a conhecer

Querendo de alguma maneira recompensá-lo, pediram-lhe que aceitasse metade das riquezas que havia trazido. O Anjo então deu-se a conhecer e disse ao velho:

"Agora é tempo de eu manifestar a verdade. Quando sepultavas os mortos e te ocupavas em obras pias ou em fervorosas orações, eu oferecia tudo ao Senhor. E porque Ele te amava, quis que a cegueira aumentasse teu merecimento; depois Deus mandou a mim para curar-te e trazer-te todos estes bens. Pois eu sou o Anjo Rafael, um dos sete espíritos que estamos continuamente na presença de Deus. Louvai, pois, ao Senhor e contai a todos as suas maravilhas."

Dito isto, desapareceu. Eles ficaram por três horas prostrados no chão bendizendo o nome de Deus.

Tobias viveu ainda quarenta e dois anos; sentindo, depois, que se avizinhava a hora de sua morte, chamou o filho e recomendou-lhe que se mantivesse fiel e constante no Santo serviço de Deus. Depois, serenamente, expirou, na paz do Senhor, com cento e dois anos de idade.

O filho atingiu a idade de noventa e nove anos. Ele, seus filhos e netos imitaram as virtudes paternas; por isso foram sempre benquistos dos homens e abençoados por Deus.