Margarida de Cortona foi, tal qual Madalena da Betânia, a princípio grande pecadora, depois ilustre penitente. Nasceu em Alviano, na Toscana; chama-se-lhe de Cortona, do nome do lugar em que foi sepultada.
Desde a mocidade, a beleza a expôs a grandes desordens. Por nove anos permaneceu unida a um homem rico, o qual lhe ministrava com abundância com que satisfazer ao pendor pelo luxo e pelos prazeres.Teve dele um filho, que mais tarde entrou na ordem dos irmãos Menores. Entretanto, no meio de uma vida inteiramente culpada, era senhora de singular compaixão pelos pobres. Tinha acessos de devoção em que dizia, à vista de certos lugares: "Como seria bom orar aqui! Como é lindo este lugar para uma vida penitente e solitária!"
De regresso ao quarto, muitas vezes deplorava a sua mísera condição, E quando os habitantes a saudavam, ela os censurava, afirmando que, conhecedores que eram da sua vida criminosa, não deviam sequer dirigir-lhe a palavra.
Um dia em que as companheiras lhes censuravam o atavio, dizendo: " Que será de ti, vaidosa Margarida? Respondeu-lhe: " -Virá o tempo em que me chamareis santa, quando eu for verdadeiramente, e ireis visitar-me com um bordão de peregrino."
No ano de 1277, seu marido ou sedutor deixou um dia a casa, levando em sua companhia uma pequena cadela.. Alguns dias depois, a cadela voltou sozinha, ganindo, e, puxando Margarida pelas vestes, esforçava-se por arrastá-la para fora de casa. Margarida seguiu-a, assombrada, até um monte de lenha, onde o animal parou, olhando para a lenha e tocando-a, como para dizer à patroa que a tirasse. Margarida afastou alguns pedaços, e notou que o homem já estava morto e sobre o corpo lhe fervilhavam vermes.
Sentiu-se de tal maneira impressionada com o espetáculo que, arrependendo-se da vida passada, foi, chorosa, atirar-se aos pés do pai, para lhe suplicar perdão. O pai, instigado por uma madrasta, expulsou-a de casa. Retirou-se a jovem desde então para Cortona, na companhia de algumas piedosas pessoas, e lá mudou inteiramente de vida.
Em breve, aspirando a coisa mais perfeita, solicitou dos frades menores de Cortona lhe dessem o hábito de penitente da ordem terceira de São Francisco. Os frades hesitaram longamente. Margarida era ainda jovem, pois contava apenas vinte e cinco anos. Embora não mais usasse outro, nem pérolas, e se cobrisse de vestes muito pobres, e, embora, em vez de se ornar, procurasse tornar-se feia, continuava a ser bela. Os bons religiosos temiam, pois, pela perseverança dela.
Todavia vendo que o seu fervor aumentava de dia para dia, aceitaram-lhe os rogos e lágrimas, e lhe concederam o hábito de penitente. A partir de então, O Espírito supremo a transformou em outra criança: o que, desde aquele momento, a dominou inteiramente foi o amor de Deus. Procurava, constantemente o lugar mais solitário, para conversar apenas com Deus, na meditação, na prece, nas lágrimas, nos jejuns e vigílias; o seu único leito era o chão nu; a sua morada uma pequenina cela. A atenção se lhe concentrava nos pobres.
Transformou uma casa em enfermaria para os doentes; o fruto do seu trabalho, as esmolas que lhe davam ou que ela própria pedia, tudo era para eles. A meditação habitual eram os mistérios de Jesus Cristo, particularmente a meditação da sua dolorosa paixão; Margarida estava presa à cruz com ele, mediante os seus próprios sofrimentos. O Salvador revelou-lhe muitos segredos.
Na véspera de Santa Clara, após a comunhão, ouviu-o dizer: "Abençoadas sejam todas as dores que padeci por tua alma, bem como a Encarnação; abençoados todos os trabalhos que suportei, e o amor que me uniu ao gênero humano. Hoje, tenho poucos bons filhos em comparação ao número dos maus; mas quando mesmo tivesse apenas um no mundo, continuaria a abençoar, por ele, as dores que padeci."
(...) O exemplo de sua vida santa e penitente, unido à eficácia das suas preces e austeridades sem fim, converteu grande número de pessoas, provenientes, às vezes, de países distantes, para lhe dar provas de reconhecimento, ou para se recomendar às suas preces.
As próprias almas do purgatório, por permissão divina, entravam com ela na misteriosa correspondência divina, para lhe solicitar os piedosos sufrágios. Estando ela, um dia a orar por dois artesãos que lhe haviam aparecido, dizendo-lhe terem sido mortos por salteadores, sem que pudessem confessar-se, e sentirem, portanto, pesar pelos erros cometidos, respondeu-lhe o Salvador: "Dizei aos frades menores que se lembrem das almas dos mortos; são em número grande, que mal pode o espírito do homem imaginá-lo, e, entretanto, pouco socorridas são pelos amigos."
Soube Margarida, por revelação, que sua mãe fora libertada do purgatório, depois de dez anos; que seu pai de lá saíra, igualmente, mas após padecer castigos muito mais severos. Um dia, orava ela pela criada morta, disse-lhe o anjo da guarda:
- "Ficará no purgatório durante um mês, mas lá padecerá leves punições, e isso pela cólera em que incindiu por excesso de zelo; depois, será levada para o meio dos querubins."
O Salvador disse-lhe um dia de Purificação da Santa Virgem: "Os três mortos pelos quais orastes esta manhã, segundo a opinião dos seus juízes, não estão absolutamente condenados, mas padecem tão extremados tormentos que, se não fossem visitados pelos bons anjos, se julgariam condenados, por estarem muito perto dos que são realmente condenados. Como entre os religiosos há celas distintas, o mesmo se dá para as penas do purgatório: uns são purificados em espessas trevas, outros em rápidas torrentes, outros no gelo, outros em fogos devoradores, etc." Quanto a Margarida de Cortona, foi purificada já nesta vida pela penitência, pelos jejuns, austeridades, doenças, cruzes, e sobretudo por uma ardente caridade de Deus e do próximo.
Faleceu em 22 de Fevereiro de 1297. O Papa Leão X, comprovando a verdade dos milagres que se haviam realizado por intercessão dela, permitiu à cidade de Cortona lhe celebrasse festa.
Em 1623, Urbano VII estendeu tal permissão a toda a ordem de São Francisco. Finalmente, Bento XII canonizou a bem-aventurada Margarida em 1723. O corpo se conservou sem o menor sinal de corrupção; encontra-se em Cortona, na igreja das religiosas de São Francisco, que deixou o nome de São Basílio, para tomar o de Santa Margarida. (Livro Vida dos Santos, Padre Rohrbacher, Volume III, p. 356 à 361)