Cristo, Nosso Senhor, quando disse: “ide a todos os povos e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”, lançou o bastão para que seus apóstolos conquistassem todas as nações. Hoje, na celebração de São Carlos Lwanga e seus companheiros mártires, veremos que mesmo em terras onde o paganismo dominou por séculos, a Uganda, a luz do Evangelho brilhou num maravilhoso testemunho.
Os estudiosos das Sagradas Escrituras tentam, com base em documentos e provas arqueológicas, dimensionar até onde se estendeu a influência dos judeus no Antigo Testamento. Há algumas vertentes que comentam que Sabá, de onde veio a distante Rainha visitar Salomão, é o hoje o país da Etiópia, no leste Africano.
Alguns dos Apóstolos teriam ido para lá, depois de terem adentrado o Egito, como São Mateus, um dos evangelistas. Nos Atos dos Apóstolos lemos também que o diácono Felipe, um dos primeiros ordenados, teria evangelizado um Eunuco, da corte real, e seguido com a caravana para além do deserto. Tais histórias impregnaram o imaginário medieval cristão, e, por muito tempo, se tinha a ideia de que existia um reino cristão no coração da África, a corte da Abissínia. Para lá se dirigiram muitos sábios e aventureiros, em épocas de Carlos Magno e seus pares, a fim de estabelecer uma diplomacia.
Porém, os primeiros contatos teriam se dado oficialmente, de corte para corte, somente com a ida dos portugueses no século XV, com o capitão Cristóvão da Gama, parente do curioso Vasco, o famoso navegador. Quando os europeus ali chegaram, de fato presenciaram a existência do rei cristão que lá vivia e de como ele se agarrava à doutrina dos apóstolos mesmo sem contato com outros irmãos de religião por tanto tempo.
Infelizmente, devido a incorrespondência de uns e de outros, a Abissínia fechou suas portas para os portugueses, declarando guerra aos estrangeiros e encerrando o contato. A Grande Etiópia dos reis de ébano ficou inacessível aos caridosos pastores de Cristo, que muito se lamentaram de não poderem continuar a ministrar os sacramentos ao povo africano.
Mais de 300 anos depois, porém, por volta dos anos de 1850, um país vizinho da Etiópia, a Uganda, filhos das mesmas tribos e de mesma vocação, abre as portas novamente para o credo cristão. Os padres europeus, chamados de padres brancos pelos africanos, adentram novamente a corte e prega o nome de Jesus. As conversões são muitas, mas o rei, mesmo que inicialmente propenso a aceitar a fé, não se permite viver sem a poligamia, uma prerrogativa real, e se vê furioso contra os padres que o incentivavam a acabar com o comércio escravo de sua gente. O rei Mwanga estava lucrando enormemente vendendo escravos às nações exteriores.
Ele, então, faz o impensável: determina que todos os padres sejam banidos de seu reino, e reúne todos os cristãos de sua corte. Entre eles, um se destaca: é São Carlos Lwanga, pajem do serviço real, e que toma a voz contra o tirano que atenta contra a vida dos seus. Mwanga quer que os cristãos reneguem sua fé, mas Carlos Lwanga é categórico e rejeita a proposta, perguntando se, em algum momento, o credo cristão alguma vez ofendeu o rei ou os interesses de um justo reinado. O rei, sem ter o que dizer, os ameaçou matar, se não se retratassem. E, em 1885, mais uma cena de martírio se definiu.
São Carlos Lwanga foi o primeiro. Foi exibido como exemplo, dado como uma oferenda aos deuses da corte. Um feiticeiro o amarrou em um poste e montou uma fornalha embaixo de seus pés. Mas, com uma crueldade imensa, não colocou fogo o bastante para que Carlos morresse com as queimaduras ou asfixiado, mas só o bastante para que seus pés cozinhassem. Em resposta a esse ato vil, Lwanga disse: “Pobre homem bobo! Não entendes o que estás a dizer. Estás me queimando, mas é como se estivésseis colocando água sobre minha cabeça. Eu estou morrendo por amor a Deus, mas fique atento pois se não te arrependeres, é tu que queimarás pela eternidade”.
E assim, um por um, depois da morte terrível e lenta de São Carlos Lwanga, mais 22 companheiros encontraram o fim no decreto do Rei Mwanga. Os ugandenses foram beatificados por Bento XV e canonizados por Paulo VI a 18 de outubro de 1964.
A luz da Cristandade ardeu no coração do reino africano, e a tentativa de abafamento dos pagãos não pode esconder seu brilho. Mesmo perseguidos, a fé dos ugandeses mártires é semente para novos cristãos, como uma vez disse Tertuliano.
Que Deus mostre esta divina fogueira ao mundo, e faça resplandecer a providencialidade dos nossos irmãos africanos. Que a justiça seja feita aos seus, e que todos vejam do que são capazes, que divinas oportunidades façam essa luz ser posta em cima do alqueire. Que o sangue derramado por São Carlos Lwanga e seus companheiros frutifique num reino cristão novo, à modo de seu povo, e que a Santa Igreja possa sorrir com benevolência para estas novas vocações.