São Boaventura categorizou logo seu modo de estudar. Ficaram consagradas estas suas palavras, que bem ilustram seu modo de proceder:
"Não se pense que basta a leitura sem a unção, a especulação sem a devoção, a investigação sem a admiração, a circunspecção sem a exultação, a habilidade sem a piedade, a ciência sem a caridade, a inteligência sem a humildade, o estudo sem a graça divina, o modelo sem a sabedoria divinamente inspirada".
Em todas suas obras se nota o tom piedoso e seu método de amor. Por isso ficou conhecido como o Doutor Seráfico, pois, segundo Dionísio Areopagita, os Serafins são os que estão mais próximos de Deus porque mais o amam.
No dia dedicado ao grande discípulo de São Francisco, convém que contemos um pouco de suas obras e de sua docência na cátedra da grande universidade de Sorbonne.
Para saber mais sobre a vida de São Boaventura, clique aqui.
Na mesma época de São Boaventura, outros membros dos Frades Menores e da Ordem dos Pregadores começaram a lecionar nas cátedras das instituições mais prestigiosas da época. Ora, era costume que esta função fosse desempenhada por membros do clero secular, alguns dos quais começaram a hostilizar os professores das ordens mendicantes, considerando-os intrusos.
Essa antipatia estendeu-se ao campo teológico e ascético. Contestava-se o seu direito de ensinar na Universidade e chegava-se até a pôr em dúvida a autenticidade da sua vida consagrada. Certamente, as mudanças introduzidas pelas Ordens Mendicantes no modo de entender a vida religiosa tão inovativas que nem todos conseguiam compreendê-las.
São Boaventura manteve-se firme nessa contenda. Com magistral sabedoria, soube refutar os adversários, não só por sua oratória, mas também por seus escritos. Dentre estes, destacam-se De perfectione evangelica e Apologia pauperum, nos quais defende a pobreza praticada pelos religiosos, tendo como modelo o próprio Nosso Senhor. A Santa Igreja se enriqueceu com essa explicitação doutrinária, fruto da fidelidade do Santo ao carisma do Fundador e de seu amor à verdadeira doutrina.
Entre os seus escritos filosóficos, temos o Itinerário da mente a Deus e As seis asas do Serafim como inovadores na disputa intelectual que havia pelos arredores da faculdade. A Cristandade conhecia, em São Tomás de Aquino e seu mestre Santo Alberto Magno, a defesa das obras de Aristóteles.
Pois antes havia apenas a tradução dos árabes, e se percebiam muitos erros de doutrina que não faziam jus à lógica do filósofo grego. Por isso, encucados com estas versões, alguns se puseram a traduzir diretamente do grego, presenteando a era medieval com uma grande produção cultural.
São Tomás consonava com Aristóteles em muitas questões recorrentes da filosofia, como a constituição do homem, corpo e alma, matéria e forma. Já São Boaventura não tinha tanta simpatia pela produção do grego, junto com seu mestre, Alexandre de Hales, que preferia os versos de Platão. O Doutor Seráfico escreveu as referidas obras para pontuar sua perspectiva. A visão especulativa do santo franciscano sempre começava com a via devota, geralmente comentando alguma passagem de seu pai espiritual.
É por isso também que o santo foi instado a escrever a vida de São Francisco de Assis, tornando-se sua versão a oficial da ordem franciscana. A piedade que manifestava em seus escritos quando narrava os acontecimentos extraordinários que cercaram o Poverello de Assis chegam até os nossos dias, intitulados na obra Legenda Maior – Vida de São Francisco de Assis.
Outras obras de sua autoria são: Brevilóquio, Redução das Ciências à Teologia, A Direção da Alma e a Vida Perfeita e Conferência dos Dez Mandamentos
O importante é sempre lembrar da intenção dos escritos de São Boaventura: todos foram direcionados para aumentar o amor do leitor a Deus.
Perguntou-lhe, certa vez, São Tomás: "De qual livro haures tua maravilhosa ciência?". O santo Doutor respondeu-lhe com simplicidade, apontando para um crucifixo: "Aqui está toda a minha biblioteca". Seguindo a via de seu Pai Francisco, este amor a Cristo crucificado foi o centro de sua vida e de sua sabedoria.
Séculos mais tarde, outro leitor assíduo de suas obras - São Francisco de Sales - comentaria: "Ó meu Santo e Seráfico Doutor Boaventura, em quem não vejo ter outro papel senão a Cruz, outra pluma a não ser a lança, outra tinta que o Sangue de meu Salvador, quando escrevestes vossos divinos opúsculos! Ó palavra inflamada a vossa, quando exclamais: Quão agradável e boa é a companhia do Crucifixo!".
Cf. Revista Arautos do Evangelho, Julho/2013, n. 139, p. 32 à 35