"O que devo fazer para amar verdadeiramente a Nosso Senhor Jesus Cristo?" – perguntou uma vez São Pedro Claver. Santo Alonso, porteiro da ordem dos Jesuítas, a cujo também pertencia o moço Claver, não se contentava em dar um simples conselho, mas descortinava os ilimitados horizontes da generosidade e do holocausto: "Quantos dos que vivem ociosos na Europa poderiam ser apóstolos na América! Não poderá o amor de Deus sulcar esses mares que a cobiça humana soube cruzar? Não valem também aquelas almas a vida de um Deus? Por que tu não recolhes o Sangue de Jesus Cristo?"
As ardentes palavras do velho porteiro acenderam labaredas de zelo que acabariam por consumir o coração de Pedro Claver. Tendo sido mandado para as terras da Nova Granada, hoje Colômbia, tomou como missão o cuidado do corpo e das almas daqueles pobres negros escravizados pelos poderosos do mundo.
Levando em sua mão direita um bastão encimado por uma cruz e um belo crucifixo de bronze pendurado no pescoço, saía Pedro Claver todos os dias para catequizar os escravos. Calores extenuantes, chuvas torrenciais, críticas e incompreensões até dos próprios irmãos de vocação, nada arrefecia sua caridade. Com frequência batia nos pórticos senhoriais da cidade pedindo doces, presentes, roupas, dinheiro e almas decididas que o auxiliassem em seu duro apostolado. E não poucas vezes nobres capitães, cavaleiros e senhoras ricas e piedosas o seguiam até as míseras moradias dos escravos.
Entrando nesses lugares, seu primeiro cuidado dirigia-se sempre aos doentes. Lavava-lhes o rosto, curava suas feridas e chagas e repartia comida aos mais necessitados. Apaziguadas as penalidades do corpo, reunia então a todos em torno de um improvisado altar, os homens de um lado e as mulheres de outro, e iniciava a catequese que ele sabia colocar maravilhosamente ao alcance dos escravos.
São Pedro Claver costumava pendurar à vista de todos uma tela pintada com a figura de Nosso Senhor crucificado, com uma grande fonte de sangue correndo de seu lado ferido; aos pés da Cruz, um sacerdote batizava com o Sangue Divino vários negros, os quais apareciam belos e brilhantes; mais abaixo, um demônio tentava devorar alguns negros que ainda não haviam sido batizados.
Dizia-lhes, então, que deveriam esquecer todas as superstições e ritos que praticavam nas tribos e lugares de origem, e lhes repetia isso muitas vezes. Depois lhes ensinava a fazer o sinal-da-cruz e lhes explicava paulatinamente os principais mistérios da nossa Fé: Unidade e Trindade de Deus, Encarnação do Verbo, Paixão de Jesus, mediação de Maria, Céu e inferno. Pedro Claver compreendia bem que mentalidades rudes não podiam assimilar ideias abstratas sem a ajuda de muitas imagens e figuras. Por isso lhes mostrava estampas nas quais estavam pintadas cenas da vida de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, representações do Paraíso e do inferno.
Após inúmeras jornadas de árdua evangelização, batizava-os finalmente. Para celebrar este Sacramento utilizava uma jarra e uma bacia de fina porcelana chinesa, e queria que os escravos estivessem limpos. Introduzia seu crucifixo de bronze na água, abençoava-a e dizia que agora aquele líquido era santo, e que após serem lavadas nessa água suas almas se tornariam mais refulgentes que o sol.
Calcula-se que ao longo de sua vida São Pedro Claver batizou mais de 300 mil escravos. Aos domingos, percorria ruas e estradas da região chamando-os à santa Missa e ao sacramento da Penitência. Dias havia que passava a noite inteira confessando os pobres escravos.
Certo dia de agosto de 1654, disse Claver a um irmão de hábito: "Isto se acaba. Deverei morrer num dia dedicado à Virgem". Na manhã de 6 de setembro, à custa de um imenso esforço, fez- se conduzir até a igreja do convento e quis comungar pela última vez. No dia seguinte, perdeu a fala e recebeu a Unção dos Enfermos. Entre 1h e 2h da madrugada de 8 de setembro, festa da Natividade de Maria, com grande suavidade e paz, o escravo dos escravos adormeceu no Senhor.
Lembremos da visão que Santo Alonso, aquele mesmo que o animara, teve antes mesmo de São Pedro Claver viajar à América: sentiu-se arrebatado até o Céu onde contemplou incontáveis tronos ocupados pelos bem-aventurados e, no meio deles, um trono vazio. Escutou uma voz que lhe dizia: "É este o lugar preparado para teu discípulo Pedro, como prêmio de suas muitas virtudes e pelas inúmeras almas que converterá nas Índias, com seus trabalhos e sofrimentos".
De fato, hoje celebramos o santo que deu sua vida pelos mais pobres, e fez da luta deles a sua própria luta e recompensa.
Trechos adaptados da Revista Arautos do Evangelho, Set/2005, n. 45, p. 20 a 23.