São Marcelino foi um santo leigo que, com seu testemunho sincero, deu um exemplo de integridade. Ele foi condenado como criminoso por desonrados cidadãos que o acusaram de uma falcatrua. Vejamos um pouco como foi esta questão.
São Marcelino viveu no tempo de Santo Agostinho, a águia de Hipona, e era seu amigo, além de lhe perguntar muitas dúvidas e sadias curiosidades. Era de uma alta função no império, tabelião e tribuno. Também era um excelente pai de família, e o Santo o elogiava publicamente, como “homem notável pela estima de todos e pela religiosidade”. Algumas obras do sábio de Hipona foram escritas após as consultas de São Marcelino.
Porém, avizinhava-se da vida do santo tribuno uma situação onde seria provado como Cristo o foi: seria tido em conta de malfeitor pelo povo.
O Império Romano passou pela turbulência do pecado. Diversos imperadores, um mais louco que o outro, procurando saciar até o extremo seus desejos, promulgavam decretos de morte por todo o território. Depois de Nero, colocar a culpa nos cristãos por tanta desordem na Grande Cidade se tornou fácil, até a vinda de Constantino, que deu liberdade à assembleia cristã.
Diocleciano foi um desses ferrenhos perseguidores. Em 310, ele promulgou uma lei onde todos os livros sagrados, as bíblias, deveriam ser queimadas em praças públicas. Muito cristãos, receosos do martírio, muitas vezes apegados demais à terra, cederam e pecaram contra sua fé. Esses eram chamados de apóstatas.
Pois bem, quase 100 anos depois, São Marcelino está vendo um problema se avolumar em sua região: o bispo Donato intervém na eleição do Bispo Ceciliano, em Cartago, pois este fora ordenado por apóstatas que depois da perseguição voltaram à Santa Igreja pedindo perdão por terem queimado as Sagradas Escrituras.
O bispo Donato, em sua concepção pouco ajustada, tinha em conta que os Sacramentos foram instituídos por Cristo para pessoas perfeitas e santas usufruírem deles. De modo que o bispo Ceciliano não podia assumir a diocese de Cartago pois seus próprios “pais” na fé tinham sido desertores, invalidando o sacramento da ordem que recebera.
A Santa Igreja, em sua sabedoria, em sua fidelidade a Cristo, não limita os sacramentos somente àqueles que alcançaram alta perfeição espiritual. Foi o próprio Senhor quem diz: “Vim para os doentes, e não aos sãos”. De modo que, com sinceridade de consciência, aquele que vai à confissão e pede perdão com uma disposição de alma que não pode enganar a Deus, este é absolvido e livre para viver a fé em sua comunidade.
Não temos relatos precisos de quem foram os bispos que ordenaram Ceciliano, ou como foram suas possíveis apostasias ou seus possíveis pedidos de perdão, mas Ceciliano, dentro das leis dos sacramentos que havia, atendia os requisitos para assumir como pastor.
Donato, assim, lançando sua contestação, alçava seu orgulho e arrogância para o mais alto, e, é claro, seu interesse também. A diocese de Cartago sempre fora uma referência de riqueza e importância no Império Romano antigo.
Como São Marcelinho era o tribuno, participou, em 411, de uma conferência de bispos para decidirem em uníssono a eleição para o trono episcopal de Cartago. Sério, bem referenciado, com a alma nas mãos, São Marcelino não tinha porque contestar a eleição de Ceciliano.
Os donatistas, vendo que não tinham apoio civil, armaram-lhe uma trampa: ele foi acusado diante dos nobres da região de ser um traidor, de ser um cúmplice de Heracliano, um usurpador da província de Cartago. Imediatamente se abriu um inquérito que de justo não teve nada. Rapidamente, a sentença de São Marcelino foi decretada: seria decapitado. E, em 13 de setembro de 411, caía diante da espada do soldado do imperador.
Um ano depois, porém, o conde que abriu seu processo reconheceu a armadilha jurídica e a falsidade das testemunhas. A Santa Igreja adotou sua festa para o dia 05 de abril, sendo comemorado hoje como um mártir cheio de fé.