No século seis, um dos bispos mais ilustres entre os francos, e de origem franca, era São Medardo. Nasceu em Salenci, perto de Noyon, de um senhor franco, chamado Netardo, e de uma gaulesa, chamada Protágia. Mostrou, desde a infância, amor acendrado pelos pobres. Frequentemente lhes dava o seu alimento, às escondidas, e jejuava o resto do dia. Relata-se que, guardando um dia os cavalos do pai, na ausência dos criados, deu um deles a certo viajante fatigado. A mãe havia-lhe feito uma veste para ir à escola na cidade de Vermandois, depois da chamada São Quintino.

Um dia, cedeu-lha, mas ele preferiu vestir com ela um pobre. Os pais, conhecendo-lhe as inclinações virtuosas, não se opunham. O pai lhe havia dito: Faze como quiseres; somente conserva o que nos é necessário para viver. Ele tinha por condiscípulo um jovem chamado Eleutério, com o qual se ligou em estreita amizade. Trata-se de Santo Eleutério, bispo de Tournai.

As virtudes de Medardo cresciam com a idade, e a sua reputação com as virtudes. Era já conhecido em quase toda a Gália, quando, após a morte de Alomério, foi ordenado bispo de Vermandois, por São Remi, pelo ano de 530. Transferiu a sede para Noyon, cidade mais fortificada do que a antiga Augusta dos Vermandois, que havia sido destruída pelas incursões dos bárbaros no século quinto. Mas nada mostra melhor a estima que tinham pelo mérito desse santo bispo do que se julgou dever fazer em seu favor contra as regras ordinárias de disciplina. Santo Eleutério, bispo de Tournai, morreu algum tempo depois, e Medardo foi eleito, com o consentimento do rei Clotário, do povo e do clero, para o governo dessa igreja, com a de Noyon; as duas igrejas, governadas por um mesmo bispo, permaneceram unidas durante seiscentos anos.

Santo Eleutério havia sucedido a Teodoro na sede de Tournai, Era uma das maiores dioceses de toda a Gália, estendendo-se até Gand e Antuérpia, mas talvez também a que conservava o maior número de idólatras. Eleutério cultivou o vasto campo com um zelo infatigável. Muito fez, e sofreu ainda mais; mas seus milagres convenceram por fim os espíritos, ao mesmo tempo que sua doçura conquistava os corações. Ressuscitou a filha de um tribuno, a qual já estava enterrada, e não se vingou dos maus tratos que havia recebido dos habitantes de Torunai, a maior parte idólatras, mas livrando-os com suas orações de uma moléstia contagiosa. Homem tão poderoso em obras não podia deixar de o ser em palavras. Converteu grande número de pagãos com suas pregações, e assegura-se que teve o consolo de batizar onze mil numa semana., Santo Eleutério fez muitas vezes a peregrinação a Roma para expor aos Papas santo Símaco e santo Hormisda a fé que pregava, e renovar-se no espírito do apostolado nas tumbas dos apóstolos.

Pelo ano de 520, com trinta e um anos de episcopado, com setenta e um anos de idade, afligiu-se, ao ouvir que os filhos da igreja perturbados estavam com as heresias de Nestório e de Eutíquio. Ordenou, pela autoridade do Pontífice Romano, que todos os hereges fossem expulsos, se não se confessassem Jesus Cristo conforme a crença da Igreja. Marcaram o dia para o sínodo reunir-se: os hereges compareceram, bem como os católicos. Após uma discussão assaz viva de parte a parte, o santo bispo levantou-se, e, fazendo sinal para silêncio com a mão, disse: "Vós todos que confessais o Pai e seu Filho, com o Espírito Santo escutai". E expondo claramente o mistério da Encarnação, refutou com igual força as heresias opostas por Eutíquio e Nestório; declarou e provou por alto que o Espírito Santo procede do Filho com o Pai.

E concluiu nestes termos: "Se alguém contradiz esses decretos, seja anatematizado da parte do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Tendo assim falado, assentou-se; os católicos abençoaram a Deus em altas vozes, enquanto os hereges se retiravam confusos.

Santo Eleutério morreu santamente pelo ano de 531, após haver recebido o corpo do Senhor com grandes sentimentos de piedade. Sua festa é celebrada em 20 de Fevereiro.

São Medardo havia se dirigido a Tournai para ali presidir às exéquias de Santo Eleutério, seu particular amigo. Mas a Providência tinha com ele outros desígnios para o bem dessa igreja, cujo governo foi obrigado a assumir sem deixar a sua.

Então o seu zelo parecia crescer com o rebanho. São Medardo morreu após quinze anos de episcopado, e sua morte não se revelou menos esplendente do que a vida, pela pompa de suas exéquias e os milagres que as acompanharam. Informado de sua enfermidade, o rei Clotário foi visitá-lo e pedir-lhe a benção, mas não permaneceu lá por longo tempo. Para consolar-se da morte do santo bispo, que considerava poderoso protetor junto de Deus, mandou levar o corpo a Soissons, onde mantinha a sua corte, e prometeu mandar construir uma igreja e um mosteiro sobre a sua sepultura, numa de suas terras chamada Crouy.

Remonta a esse fato a origem do célebre mosteiro de São Medardo de Soissons, As cadeias de várias prisioneiros quebraram-se durante o préstito fúnebre, e São Gregório de Tours viu-as presas à sepultura do santo em memória do milagre.

Fotos: santiebeati.it
(Vida dos Santos, Padre Rohrbacher, Volume X, p.148 à 151)