O que é a beleza?

A humanidade é formada por seres que compartilham uma mesma natureza, mas que possuem diferenças que a fazem ser um emaranhado de pontos individuais que só cresce na medida em que estão conectados. Um homem pode ser melhor sozinho, mas é só quando uma vila, ou um bairro, ou uma cidade, estado ou nação progridem que podemos dizer que a humanidade melhorou. Isso significa dizer que as diferenças são essenciais para a nossa melhora. E mais: também simbolizam uma realidade espiritual desejada por Deus em sua criação como um todo: o belo existe na desigualdade.

Fundamentos e explicação

Quando abrimos as primeiras páginas da Sagrada Escritura, nos deparamos com o livro do Gênesis contando as proezas do Senhor na criação. Primeiro separa a luz das trevas, o que indica, para muitos estudiosos, o embate inicial entre anjos e demônios, aqueles que foram fiéis versus os revoltados e amargurados que tiveram com líder Lúcifer.

Logo em seguida continua o processo: águas e terras, sol e lua, plantas, animais e, por fim, o primeiro homem. Foram, narrados pelo Gênesis, seis dias de criação intensa, um número que é muito mais simbólico do que exato; e, no sétimo dia, Deus descansou de seus feitos. Ao final de cada dia, o Senhor olhava o que tinha feito, e a Bíblia nos diz que Ele comprovava: “E era bom”. É Deus agradado de sua criação. No final, porém, há um complemento que faz toda a diferença: “E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo havia ficado muito bom”. (Gn 1, 31).

Assim, não só cada dia individualmente tinha ficado perfeito, mas o conjunto possuía algo que não é simplesmente a soma das partes: havia uma ordenação entre elas, havia uma hierarquia entre as coisas criadas que as deixava muito boas.

O que é o belo?

Tendo visto que o conjunto ordenado hierarquicamente da criação é superior a uma obra ou outra, pois é o próprio Deus que se manifesta sobre isso, devemos nos perguntar o que é o belo. Sua ação se dá através dos sentidos, pois o belo nos agrada sensivelmente.

Mas a própria beleza tem uma escala de graus. Costumamos falar que algo é mais bonito que outro, ou que um animal é mais bonito que outro. Para essa comparação, contudo, é preciso um fiel da balança, um ponto absoluto que serve como comparação. E São Tomás, baseando-se em Santo Agostinho, vai dizer que, inato na natureza humana, esse absoluto é Deus. Pois, depois de adentrar os sentidos, a beleza tem a função de definir a ideia, influenciando-a. E a atitude que será uma consequência do modo de pensar de um ser humano foi ocasionada por esta tendência, seja ela bela, mais próxima de Deus, ou feia, mais distante de Deus.

Um exemplo prático: em uma sala suja, desorganizada e mau cheirosa, é difícil que pensamentos de organização venham, o que limita bons hábitos. Já uma área de trabalho adequada, bem iluminada e perfumada facilita nossa expansão intelectual e nos ajuda a perfazer melhor o nosso trabalho.

O belo existe na desigualdade

Se, como vimos, a beleza suprema é o próprio Deus, aquele que é o ponto de comparação entre todas as outras belezas do mundo, isso significa que, ao seu olhar, a constituição hierárquica da sociedade é bela, pois é muito boa. De fato, quando cada ser desempenha uma tarefa, com alegria e com entendimento, os frutos são abundantes. E isso se estende não só nas relações humanas, mas nas naturais também: o Senhor dá ao ser humano o leme do meio-ambiente, e faz de nós governadores. Esse sublime e tão sério cargo reflete em nós, como humanidade, na criação de governadores que se encarregam de gerir não só os recursos naturais, mas também a nossa organização.

Portanto, é desejo de Deus que as relações de desigualdade existam, e não só: elas fundamentam o belo em nossa comunidade. É por isso que o trabalho do demônio, para perverter a criação divina, é reduzi-la a uma igualdade completa, acabando com as desigualdades superiores, como diferenças de cultura, inteligência e desenvolvimento, até as mais simples e genéricas, como as desigualdades financeiras. E todos aqueles que lutam livremente para isso já tem seu partido tomado, e não é a favor de Deus.

Entender as desigualdades que nos compõe como indivíduos dentro da humanidade é ponto essencial para construir a obra de Cristo.

Injustiça é desigualdade?

Por fim, para completarmos nossa análise, precisamos entender que injustiça não é desigualdade. Compactuar com um sistema falho que exclui as diversidades é um atentado à criação divina, que deveria se enriquecer com todas as desigualdades que existem nela. E ordená-la hierarquicamente não é dar benefícios a quem tem mais tirando de quem tem menos: é, antes de tudo, cada um entregar-se de corpo e alma ao seu dever dentro da sociedade.