“Quão numerosas, ó Senhor, são vossas obras, e quanta sabedoria em todas elas!” (Sl 103, 24) – exclama o salmista, pervadido de admiração, ao contemplar a incomensurável variedade de criaturas que enchem o universo.

Nos esplendores da aurora, varando as nuvens, os raios vitoriosos do sol derramam sua generosa claridade sobre a vastidão da Terra. A luz desce as montanhas, atinge as encostas e vales, fecunda plantações, suscita o concerto das aves e desperta os rebanhos.

Dir-se-ia que o astro-rei tem pressa em voltar a espargir seus benefícios, e que a Terra, há pouco escura, cheia de saudades, exulta afinal pelo reencontro.

Por sua vez, no decurso das estações e dos tempos, o mundo vegetal se apressa em distribuir suas riquezas sem conta, e parece rejubilar-se em esbanjá-las.

Trigais dourados e plantios infindos para o homem, pastagens copiosas para o gado, frutos em profusão para os pássaros, abundância para todos. A generosidade se apresenta também como a regra desse universo vivo de raízes, ervas e troncos, que o solo dadivoso se compraz em sustentar e fortalecer.

Quanta prodigalidade!

A natureza se revela como imensa sinfonia, na qual seres irracionais ou inanimados, cumprindo perenes desígnios do Criador, multiplicam os favores e persistem na doação generosa, ou são beneficiados e recebem de outros o necessário para sua subsistência.

Inúmeras lições poderíamos auferir de tantas maravilhas, mas, sem dúvida, há uma que salta aos olhos do bom observador: a ordem da criação resplandece diante de nós como magnífico espelho da caridade.

Caridade! Virtude desconhecida no paganismo e apenas vislumbrada no Antigo Testamento, desceu à terra com o Verbo de Deus e se difundiu na humanidade como divino perfume do próprio Jesus Cristo.

É por ela que todos se harmonizam: grandes e pequenos, poderosos e desvalidos.

Movidos pela caridade, incontáveis homens e mulheres mais dotados de fortuna transformaram-se, ao longo da História, em verdadeiros anjos de proteção e dedicação aos pobres e miseráveis. Pelo impulso da caridade, os corações e as bolsas se abriram: edificaram-se hospitais, alimentos foram distribuídos, dores aliviadas, lágrimas enxugadas e corpos gélidos aquecidos. Quão belos espetáculos a caridade protagonizou no relacionamento entre ricos e pobres!

O que seria dos pobres, se ricos não houvesse para consolá-los com sua ajuda? E, se não existissem os pobres, como poderiam os ricos praticar esse amor de misericórdia, do qual o Sagrado Coração de Jesus é a fornalha ardente?

Caridade! Regra perfeita de uma sociedade verdadeiramente conforme ao Evangelho, na qual os ricos, sem terem de renunciar à sua riqueza, são irmanados em Cristo com os pobres; e estes, mesmo não se enriquecendo, veem naqueles a mão dadivosa de Deus.

Nessa sociedade germinará e florescerá, até o fim dos tempos, o ideal descrito pelo Apóstolo:

A caridade é paciente, a caridade é bondosa, não tem inveja. A caridade não é orgulhosa, não é arrogante nem escandalosa, não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor. […] Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. A caridade jamais acabará (I Cor 13, 4-8).