A renovação de todas as coisas, trazida por Nosso Senhor Jesus Cristo, elevou o culto a Deus tão acima de tudo quanto O precedeu, que bem se poderia perguntar se o sacerdócio da antiga lei tinha alguma razão de ser. Contudo, encontramos em sua mais remota origem uma determinação explícita do próprio Deus.
Com efeito, no Sinai, não entregou Ele a Moisés apenas os Dez Mandamentos, gravados em pedra pela sua própria mão (cf. Ex 32, 16), mas um amplo código de normas, muitas delas de caráter litúrgico e ritual. E, entre estas, já constava a decisão de Deus de estabelecer Aarão e sua família sacerdotes a serviço de seu culto (cf. Ex 28, 1).
Mas Moisés, voltando ao acampamento, encontrou o povo entregue à idolatria com o bezerro de ouro (cf. Ex 32, 1-19); e o brilho de sua ira aglutinou em torno de si todos os filhos de Levi que, num ato de manifesta e radical rejeição ao pecado do povo, conquistaram assim o privilégio de serem consagrados definitivamente ao serviço de Deus (cf. Ex 32, 26-29).
Assim como, pela circuncisão, Abraão fora separado para Javé dentre os demais homens (cf. Gn 17, 10-14), e Moisés fora levantado em oposição ao Faraó e a todo o Egito (cf. Ex 3, 16-20), assim também quis o Senhor que o sacerdócio da antiga lei nascesse sob o signo da contradição; um signo que acompanha todos quantos querem de fato servir a Deus, desde o momento em que o Criador instituiu uma inimizade eterna entre a Virgem e a Serpente (cf. Gn 3, 15).
Inimizade, e portanto luta, cujo paladino se caracteriza pelo repúdio categórico e combativo aos erros do tempo, e pela adesão inflamada e incondicional à causa de Deus, levantando-se como exemplo para todos.
Os ritos do sacerdócio levítico, contudo, eram apenas sombra e imagem da realidade celeste (cf. Hb 8, 5), porquanto “só podiam ter valor enquanto não fossem instituídos outros melhores” (Hb 9, 10).
Sua razão de ser consistia em servir de pré-figura e preparar o caminho para algo muito maior.
Com efeito, Nosso Senhor Jesus Cristo, “eternamente perfeito” (Hb 7, 28) e constituído Sumo Sacerdote pelo Pai (cf. Hb 5, 10), tornou-Se mediador de uma aliança “muito superior” (Hb 7, 22): “santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores e elevado além dos Céus” (Hb 7, 26), é o único capaz de oferecer a Deus um sacrifício verdadeiramente agradável, perfeito e definitivo.
Esta sua excelsa perfeição elevou também o signo da contradição à sua máxima expressão, pois fez d’Ele o objeto do máximo ódio, num clímax de luta cujo desenlace foi um auge de glorificação.
Sendo Cristo o sumo, eterno e único Sacerdote, o sacerdócio fica para todo sempre associado à figura da pedra de escândalo, como elemento constitutivo.
Aos ministros ordenados, partícipes do sacerdócio eterno do Senhor, incumbe perpetuar na Terra a missão profética de dividir as águas.
Ponte entre Deus e os homens, o sacerdote é, pois, também a rocha no rio, que divide os campos entre bons e maus, fazendo revelar-se o interior dos corações.