"A Cruz Sagrada seja a minha Luz, não seja o dragão o meu guia"

São Bento tem um ponto em sua história em que aparenta ter falhado como mentor e abade. Aos olhos de um espectador atemporal, que soubesse que São Bento deveria fundar uma ordem religiosa, ele veria a tentativa de assassinato, feita pelos monges que deveriam obedecê-lo e por um padre da região, como uma parede intransponível no plano de Deus.

Como isso se resolve? Vejamos um pouco da história do patriarca dos beneditinos desde o momento em que foi juramentado de morte.

Monte Cassino, o caminho para a restauração

São BentoSabemos que é próprio dos Santos serem alvo da incompreensão e do ódio dos asseclas do demônio. O sacerdote de uma igreja próxima de Subiaco, tomado de inveja, começou a denegrir o gênero de vida de São Bento, procurando afastar de sua santa influência todos que podia. Vendo frustrados seus esforços, enviou de presente um pão envenenado. Mas um corvo, a serviço do servo de Deus, alertou-o e levou o pão para longe.

Fracassado este intento, chegou este padre ao cúmulo de introduzir no jardim do mosteiro sete mulheres de má vida, com esperança de corromper os jovens monges. Compreendendo que tudo isso era feito com intuito de persegui-lo pessoalmente, Bento nomeou prepostos seus em cada um dos doze mosteiros que havia fundado, e retirou-se de Subiaco.

Dirigiu-se então a Cassino, uma cidadezinha fortificada a meio caminho entre Roma e Nápoles. Havia lá um templo pagão no qual camponeses da região rendiam culto a Apolo. Ao redor do templo, mantinham eles cuidadosamente alguns bosques nos quais ofereciam sacrifícios ao demônio. Ali chegando, o homem de Deus destruiu o ídolo, abateu os bosques e transformou o edifício em igreja erguendo nela um oratório a São João Batista e outro a São Martinho de Tours.

Em seguida, deu início à construção do famoso mosteiro de Monte Cassino, o qual teve por único arquiteto o santo Abade e como construtores os próprios monges. Longe dos olhos dos maus, aparentemente distante de todo o sucesso, foi aí que os destroços do Império Romano deram, de fato, lugar à Cristandade Medieval.

São Bento prepara a vitória cristã

O mosteiro de Monte Cassino foi a resposta de Deus à decadência do mundo de sua época. Exemplo de governo patriarcal e de sociedade verdadeiramente cristã, em meio às nações bárbaras, exerceu enorme influência sobre os costumes privados e públicos, tanto na ordem espiritual quanto na temporal.

Além disso, enquanto erguia o edifício do novo mosteiro, São Bento erigia interiormente a Obra beneditina sobre uma base mais firme que a rocha, escrevendo sua inspirada e famosíssima Regra dos Monges. Tem ela por objetivo desprender o coração humano das trivialidades, facilitando à alma elevar-se a Deus sem obstáculos, com um proceder sempre sereno, tendo em vista a vida eterna.

Com seu conhecido aforismo "Ora et labora" (Reza e trabalha), a Regra tem o mérito de harmonizar no monge a oração e a ação, a ascese e a mística. A Regra escrita por São Bento produziu benéficos frutos em toda a Cristandade. Este sábio conjunto de normas vigorou quase com exclusividade nos mosteiros de Ocidente durante oito séculos. Entretanto, mais que a Regra, foram a santidade e o espírito de seu Fundador que deram à Ordem Beneditina a estabilidade, a força de expansão e a eficácia da sua ação civilizadora.

Inspirados pela busca da perfeição na obediência, no esplendor da liturgia, no primor do canto gregoriano e no amor à beleza posta a serviço de Deus, os filhos de São Bento exerceram um papel fundamental na cultura, nos costumes e nas instituições das nações que formaram a Europa Cristã.

O resto que voltará

São BentoHá, na dinâmica histórica da luta do bem e do mal, momentos onde Deus permite que os homens sintam todo o seu nada e se vejam como realmente são: estéreis. Pois é só com sua graça e seu favor que as nações prosperam. A lição de fracasso pela qual passou São Bento antes de fundar Montecassino não foi para ele, que tinha o espírito resignado e a alma sábia. Foi uma lição que Deus quis passar à História, aos séculos futuros, de que sempre há esperança na causa católica. É o que Nossa Senhora avisa em Fátima, depois de nos avisar dos castigos: “Meu Imaculado Coração Triunfará”

Hoje, percebemos que a Ordem de São Bento teve um extraordinário surto de desenvolvimento. Nações inteiras foram convertidas à Fé cristã pelos discípulos do santo Patriarca. Muitas famosas universidades - Paris, Cambridge, Bolonha, Oviedo, Salamanca, Salzburgo - nasceram como desdobramentos de colégios beneditinos. Inúmeros mártires deram valorosamente a vida pronunciando o nome de seu Fundador. Plêiades de cardeais, bispos e santos doutores tinham-no por mestre. Mais de 30 papas seguiram sua inspirada Regra. Finalmente, há 1500 anos, incontáveis almas se consagram a Deus sob a égide de sua santa Instituição.

Pode-se, pois, com toda propriedade, comparar esta lição pela qual passou o pai de todos os monges à palavras de Jesus no Evangelho, quando comenta o grão de mostarda: "É esta a menor de todas as sementes, mas, quando cresce, torna-se um arbusto maior que todas as hortaliças, de sorte que os pássaros vêm aninhar-se em seus ramos" (Mt 13,32).

Cf. Revista Arautos do Evangelho, Julho/2005, n.43, p. 23 à 25