Após conquistar diversos povos do Oriente, um rei assírio com o nome de Nabucodonosor convocou Holofernes, o comandante-em-chefe de seu exército, para dominar todo o Ocidente. Com um poderoso exército foi ele escravizando as populações, obrigando-as a adorarem Nabucodonosor (cf. Jt 3, 8); e chegou às fronteiras da Judeia.
Holofernes comandava um exército de 170.000 soldados de infantaria e 12.000 cavaleiros, além de imensa multidão que os seguia a pé. Mandou ele bloquear a nascente que fornecia água para os habitantes de Betúlia, e cercar a cidade por todos os lados.
A sede começou a matar muitas pessoas. E, transcorridos 34 dias, o povo se dirigiu aos chefes e anciãos de Betúlia e clamou em alta voz, dizendo que a cidade deveria ser entregue a Holofernes.
Ozias, o principal chefe de Betúlia, disse-lhes que deveriam aguentar mais cinco dias, esperando a intervenção divina. Se Deus não os socorresse nesse prazo, então entregar-se-iam a Holofernes.
Residia em Betúlia uma viúva chamada Judite. Ela sempre trajava vestido de viúva, jejuava diariamente, exceto nos dias festivos e suas vigílias. “Era muito bela […], prudente de coração e com bom senso, muito honrada […] e muito temente a Deus” (Jt 8, 7-8). Seu marido lhe deixara muitos bens, além de servos e servas.
Tendo sabido das lamentações do povo e das palavras de Ozias, chamou-o, bem como outros dois principais anciãos, à sua casa.
Quando todavia chegaram, Judite, com muita sabedoria e firmeza, increpou-os devido à promessa de entregar Betúlia, se Deus não interviesse nos próximos cinco dias. Posteriormente, entre outras coisas, disse ela: “Quem sois vós, que hoje tentastes a Deus e vos pusestes no lugar de Deus em meio aos vossos irmãos?” (Jt 8, 12). E acrescentou que se Betúlia se entregasse a Holofernes, logo depois o Templo seria saqueado. Pelo contrário, graças deveriam dar a Deus por permitir essa provação, como o Altíssimo fez com Abraão, Isaac e Jacó. “É para advertir que o Senhor flagela os que d’Ele se aproximam” (Jt 8, 27).
Pleno de admiração, Ozias disse a Judite: “Não é de hoje que se manifesta a tua sabedoria, mas desde a tua infância todos reconhecem teu bom senso e as boas disposições do teu coração […] Portanto, roga por nós […], pois és uma mulher santa” (Jt 8, 29.31).
Judite afirmou que, com a ajuda divina, faria uma proeza e acrescentou: “Vós, porém, não procureis entender o meu plano.” Os anciãos, então, disseram: “Vai em paz, e o Senhor Deus esteja à tua frente para a vingança contra os nossos inimigos” (Jt 8, 34-35); e se retiraram.
Em seguida, levantou-se, desfez-se dos trajes de viúva e colocou sua melhor roupa. E saiu, seguida por sua fiel serva, que levava uma cesta com pão, queijo, figos e várias garrafas do melhor vinho.
As duas caminharam até o acampamento inimigo. Avistando-as, um dos guardas vai a seu encontro, interrogando: “De onde vêm e quem as envia?”
“Sou filha de hebreus e fujo pela certeza de que nossa cidade em breve tombará. Venho avistar-me com o valente Holofernes, com uma importante mensagem. Vim para lhe revelar como conquistar, de vez, toda a região. Leve-nos imediatamente à sua presença”.
Por fim, diante do general, Judite lhe conta que a vida na cidade sitiada se tornara insuportável e que subornara os guardas para deixarem-na escapar. Ouvira falar da coragem de Holofernes e decidiu conhecê-lo. Por fim, contou ao general que a situação em Betúlia era desesperadora, praticamente sem comida nem água. Acrescentou, porém, que a fé dos hebreus em Deus permanecia forte e, enquanto esta prevalecesse, não se renderiam.
“Mas”, revelou Judite, “o povo está faminto e quando acabar todo o alimento o desespero os vencerá.
“Como posso saber quando isso ocorrerá para, então, capturar a cidade?”, perguntou o general.
A resposta pois veio rápida: “Não se preocupe. Antes de deixar Betúlia fiz um trato com os guardas de seus portões. Prometi ir todas as noites até os muros para trocar informações. Eu lhes contarei o que acontece aqui e eles o que se passa na cidade.
Holofernes, completamente maravilhado pela beleza e palavras da jovem que, de forma tão inesperada, entrara em sua vida e lhe oferecia a “chave” para conquistar a cidade, prometeu: “Se de fato, me ajudares a capturar a cidade, farei de ti minha esposa”.
A seguir, dá ordens para que Judite e sua serva tenham livre acesso a todo o acampamento, alertando que qualquer um que atentasse contra elas seria imediatamente executado.
As duas mulheres eram vistas vagando pelo acampamento dia e noite, mas os soldados não ousavam aproximar-se.
Passou-se um dia e, ao escurecer, Judite foi até os portões da cidade e avisou um dos guardas: “Vá a Ozias e diga que tudo transcorre conforme o plano. E, com a ajuda de Deus, venceremos o inimigo. Portanto, diga-lhe também que mantenha firme sua fé em Deus, jamais perdendo a esperança”. Logo depois, voltou ao acampamento inimigo. Na noite seguinte, no entanto, foi novamente até os portões de Betúlia e repetiu suas palavras. Toda noite, entretanto, ao voltar, a jovem viúva orava, implorando a Deus para guiar seus passos e lograr a salvação de seu povo.
Enquanto esperava o sinal da jovem para atacar a cidade, Holofernes passava o tempo a beber e, quando não estava completamente embriagado, mandava buscá-la. Judite só entrava na tenda do general acompanhada pela aia.
SAIBA MAIS Fé em Deus, divina certeza |
Passados três dias, dando enfim mostras de impaciência, ele lhe perguntou: “Graciosa, Judite, que informações me trazes? Meus homens já me cobram, mal conseguem esperar a hora de capturar a cidade e se divertir….”.
“Trago excelentes notícias”, respondeu a jovem. “Não há mais comida na cidade. Mais um dia, no máximo dois, e a fome os entregará em suas mãos”. O general retrucou: “Esta notícia pede uma celebração. Esta noite festejaremos nós dois; serás minha convidada de honra”. Judite aceitou prontamente.
Ao anoitecer, se vestiu e adornou com seus melhores pertences e se dirigiu à tenda de Holofernes. Ao vê-la, de fato, o coração do general se encheu de desejo. Sua beleza sobretudo o encantara e, feliz, começou a beber. Pede a ela, então, que ao menos uma vez prove sua festiva refeição. Judite aceita, mas diz que o fará somente se também ele provar de sua comida e de seu vinho. “Meu queijo de cabra é famoso em toda Betúlia. Estou certa de que gostará, general”.
E lhe oferece um generoso pedaço de queijo. Como previra, Holofernes gosta do queijo e também do vinho forte. Mas o queijo, propositalmente muito salgado, o fez ter muita sede, que procura saciar com enorme quantidade de vinho. Todavia, a festa avançava noite adentro e os empregados se retiraram, deixando Holofernes a sós com sua convidada. Assim que Judite se viu diante dele, bêbado e largado em seu leito, quase afogado em vinho, ela correu a avisar a serva para ficar de prontidão, à entrada da tenda.
De pé sobre a cama de Holofernes, ela rogou a Deus:
“Responde-me, ó Senhor, como respondeste a Yael, quando lhe entregaste o cruel Sissera. Enche-me de força para que possa trazer a Tua libertação a meu povo, que este homem jurou destruir. Faz, ó Deus, com que as nações saibam que o Senhor não nos abandonou.
A seguir, tomou a espada do general e deu dois golpes fatais em seu pescoço, decepando-lhe a cabeça. Posteriormente, procurou se acalmar; envolveu pois a cabeça do general em trapos e a escondeu sob seu manto. Saiu da tenda e chamou a serva: “Vem, rápido, mas com cautela para não despertar suspeitas”.
Esconderam a cabeça na cesta de provisões e juntas saíram, como vinham fazendo há dias. Chegando aos portões da cidade, Judite disse a um dos guardas: “Leve-me imediatamente a Ozias”.
Então, diante de Ozias e dos anciãos, Judite mostra o que trazia na cesta. “Eis a cabeça de Holofernes, comandante de nossos inimigos. Deus o aniquilou pelas mãos de uma mulher. Não há tempo a perder. Prepare imediatamente seus homens. Ao amanhecer, ataquem o acampamento inimigo, que não está preparado. Quando eles forem alertar seu comandante, encontrarão seu corpo, mutilado. Temendo por sua vida, fugirão, apavorados”.
Foi exatamente o que ocorreu. Com efeito, os judeus se aproveitaram da confusão, arrasando o inimigo. Ozias enviou uma mensagem aos judeus das cidades vizinhas, para que perseguissem os fugitivos.E disse, então, a Judite: “Tua fé e esperança jamais deixarão o coração dos judeus, que sempre lembrarão tua coragem. Deus faça com que sejas para sempre louvada, pois rejeitaste a queda do nosso povo e, com determinação e coragem, perseguiste teu objetivo perante Deus”.
Assim, o nome de Judite tornou-se famoso em todo Israel. Contudo, ela não voltou a se casar, morrendo aos 105 anos. Todo o povo chorou sua morte; e seus feitos heróicos têm levado fé e coragem aos corações dos judeus, através dos séculos.
Peçamos à Santíssima Virgem que nos conceda uma fé inquebrantável e uma combatividade invencível, como teve a heroica Judite, para enfrentarmos os que pretendem destruir a Santa Igreja de Deus.
1 – Cf. FILLION, Louis-Claude. La Sainte Bible commentée. 3. ed. Paris: Letouzey et aîné.1923, v.III , p. 378..
2 – CLÁ DIAS, João Scognamiglio, EP. Pequeno ofício da Imaculada Conceição comentado. 2. ed. São Paulo: Associação Católica Nossa Senhora de Fátima. 2010, v. I, p. 298.
3 – Cf. DARRAS, Joseph Epiphane. Histoire Génerale de l’Église depuis la Création jusqu’à nos jours. Paris : Louis Vivès. 1863. v. III, p.125.
4 – “The Story Of Chanukah”, The weekly Midrash, vol.1, Tzénah Urénah-The Classic Anthology of Torah Lore and Midrash Comentary, compilado por Rabbi Yaacov ben Yitzchak Ashkenazi, Mesorah Publications Ltd.