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O encanto do Natal na Alemanha
 
AUTOR: PE. JULIO UBBELOHDE
 
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Encanto do Natal

O Natal da nossa infância era muito mais natalino que o do nosso tempo de adultos. Mas haverá algum
lugar da terra onde o Natal de quem não é mais criança
 seja igualmente cativante?

Natal na Alemanha! É muito difícil dizer se em algum outro lugar soube- se cercar a data máxima da Cristandade com tanto encanto e afeto, diria mesmo, com tanta poesia.

Com efeito, a característica atmosfera do Natal, ou espírito natalino, possui profundas raízes na cultura alemã, a ponto de este povo Natal Alemanha..jpgter em seu idioma uma palavra própria para expressá-la: Weihnachtsstimmung.

Tentar descrevê-la envolve não pequena dificuldade. O Natal, como o vivem os alemães, possui demasiado calor para exprimir-se nas frias linhas de um papel. Mas uma tentativa, embora tímida, certamente trará proveito para nossas almas cristãs, pois jamais se falará a respeito do doce nascimento de nosso Divino Salvador, sem que nossos corações sejam tocados por alguma graça.

Alguns Santos preparam o caminho

O ambiente natalino não brota de repente. Ele surge aos poucos, e começa a se fazer sentir em fins de novembro quando, nas cidades grandes e médias, as lojas montam suas decorações de fim de ano, pondo em evidência todos os artigos que possam servir para presentear os amigos e familiares, no grande dia.

A Liturgia e as festas populares guiam os corações rumo ao Natal.

Próximo ao Advento, comemoram-se os Santos cujas festas ajudam a preparar o caminho para a vinda do Menino Deus. Por exemplo, São Martinho de Tours, em 11 de novembro, muito festejado na linke Niederrheinufer (margem esquerda do Reno), uma região que se estende até a fronteira com a Holanda, onde se ergue o grande santuário mariano de Kevelaer. Essa é a ocasião do Martinsgans (Grande Banquete do Ganso), em memória do insigne Santo que, quando soldado romano, cortou com a espada a metade de seu manto e a deu a um pobre, o qual na realidade era o próprio Jesus. Em Kevelaer as crianças realizam uma procissão com a imagem desse Santo, levada sobre um cavalo. Portando lanternas, elas vão cantando: “Da oben beleuchten die Sternen, hierunter beleuchten wir uns… St. Martin, St. Martin” – “No alto, as estrelas nos iluminam, aqui embaixo nos ilumina São Martinho, São Martinho…” Depois, em 6 de dezembro, o dia do grande amigo das crianças, São Nicolau, o caridoso bispo que há cerca de 1500 anos ajudava os necessitados, na região onde hoje se localiza Bari. O comércio o transformou em São Nick, ou Santa Claus, o “Papai Noel” do Brasil, ou o Weihnachtsmann na Alemanha. Este ano, porém, alguns cristãos preocupados em manter o sentido original da caridade praticada pelo venerável Santo, difundiram adesivos com a mensagem: “Para mim, somente o original!” Visam, com isso, redescobrir aquele que para muitos ficou esquecido: São Nicolau.

E em 13 de dezembro se festeja cada vez mais o dia de Santa Luzia, conhecida no norte da Europa como a “Rainha da Luz”. Na Suécia, por exemplo, este é o dia da família. Seguindo uma consagrada tradição, em cada lar a filha mais velha prepara um café da manhã especial, e o serve para toda a família, quando ainda estão todos na cama. Nesse ato, a jovem traja um vestido branco, com um largo cinturão vermelho, e porta sobre a fronte uma coroa feita de velas acesas.

Como “Rainha da Luz”, ela traz alegria em uma escura manhã de dezembro.

Esse costume relembra um fato da vida de Santa Luzia, a intrépida menina de Siracusa que levava alimentos aos cristãos perseguidos. Segundo uma multissecular tradição, ela caminhava pelas tenebrosas catacumbas do século IV com velas acesas fixas em sua cabeça, únicamercado de Natal.jpgmaneira de poder dispor das mãos para carregar os víveres. De acordo com o costume da época, usava um vestido branco. E o cinturão de tecido vermelho simboliza sua morte como mártir.

Música, mercados, pinheiros

Os domingos de Advento são recordados nas igrejas e nos lares com o Adventskranz (guirlanda do Advento), com as velas vermelhas, acesas à medida que passam os quatro domingos anteriores ao Natal.

Mas o espírito de Natal faz sentir realmente seu encanto, na Alemanha, com os Weihnachtsmärkte ou Christkindlmarkt (mercados de Natal, ou mercado do Menino Deus), que começam na última semana de novembro, em todas as grandes e médias cidades.

Os mais famosos e concorridos são os de Nürenberg, Frankfurt e München. Para visitar o de Nürenberg, a Deutsche Bundesbahn (Ferrovia Alemã) organiza saídas de trens especiais. Esses mercados natalinos são freqüentados particularmente nos fins de semana, por grupos inteiros de paróquias e famílias das redondezas. Nesses dias realizam- se programas musicais em torno da árvore de Natal.

Pequenos conjuntos musicais de instrumentos de sopro tocam peças natalinas nas praças ou nas vias de acesso, sendo premiados com moedas pelos assistentes, em menor ou maior medida, segundo a qualidade da música. Em Frankfurt, por exemplo, todos os anos, a orquestra de uma escola da cidade faz apresentações numa das principais estações de metrô. Em sua totalidade, os fundos arrecadados são destinados ao Hospital Infantil do Câncer. Conhecendo a nobre e caridosa intenção dos músicos estudantes, todos os transeuntes deixam muitas moedas. Algumas pessoas chegam mesmo a enternecer-se… Estes “mercados” localizam-se na zona antiga de cada cidade, como a Römerplatz de Frankfurt, ou a praça medieval do centro velho de Nürenberg.

Um dos mais famosos é realizado em München, na Marienplatz, a praça de Nossa Senhora, onde no alto de uma coluna está a Patrona Bavariae (Padroeira dos Bávaros), que foi visitada recentemente pelo Papa Bento XVI.

Em um dia previamente definido, coloca-se nesse local um pinheiro de gigantescas dimensões. Para estar de acordo com as proporções da praça, ele deve ter pelo menos cem anos! Geralmente, é um presente do Tirol austríaco, em cujas montanhas ainda se podem encontrar Tannenbäume (pinheiros) desse porte. Os jornais da região informam todos os dados de sua procedência: qual cidade o doces natalinos.jpgofereceu de presente, fotos da instalação, o prefeito que o recebeu, e outros detalhes.

Sem demora, erguem-se em torno da magnífica árvore de Natal casinhas de madeira artisticamente decoradas, nas quais se vendemtodos os tipos de enfeites natalinos: imagens de anjos, bolas de vidro colorido caramelos, sininhos, soldadinhos de chumbo…

Cuida-se também do bem-estar corporal

Mas não só isso. Como em toda festa popular alemã, ali se aplica uma regra infalível: “Für das leibliche Wohl wird besorgt”. Uma frase consagrada, cujo significado é: “Cuidar-se-á das necessidades do bem-estar corporal”.

Ou, em outras palavras, “abundantes comes e bebes”… Não será perda de tempo conhecermos uma breve lista do que se podesaborear enquanto caem os flocos de neve: rum quente, Glühwein (vinho tinto quente, com especiarias), heiße Mandel (castanhas assadas), Lebkuchen und Spekulatius (bolachas e pequenos bolos, com especiarias), deliciosas salsichas ou Leberkäse (bolos de carne), acompanhados de Kartoffelsalat (salada de batatas), Kartoffelpuffer (panquecas de batata com purê de maçã), além das nossas tão conhecidas e apreciadas… pipocas.

A Römerplatz de Frankfurt conta com uma atração especial, encanto da criançada: um enorme e bem-decorado carrossel, com cavalinhos, cisnes e barquinhos que, ao som da música, sobem e descem sem parar. Mas não só crianças são atraídas pelo multicolorido brinquedo: já foram vistos sisudos homens de negócio, com sua pasta na mão, andarem nos cavalinhos como qualquer menino. Cativados pela atmosfera de Natal, deixam por um momento suas preocupações, para recordar os felizes dias da inocência infantil…

A apoteose dos sinos

Dois ou três dias antes do Natal, a Römerplatz precisa estar totalmente livre e limpa. A partir do dia 23 tem lugar o Glockengeläut: o toque dos sinos de todas as igrejas do centro de Frankfurt, que se prolonga durante meia hora, no fim do entardecer.SINOS.jpg

Nessas tardes, aparece nas ruas um gênero muito característico e genuíno do povo alemão, que não se faz notar, ou talvez não se manifeste tanto, em outras épocas no ano: o amante das boas tradições e da metafísica, o qual sabe apreciar aquilo que a pessoa não vê, mas sente no fundo do coração. Nunca esquecerei o olhar vivo de um homem alto, numa hora de Glockengeläut. Cruzou comigo, enquanto caminhava pela praça, e sorriu-me enlevado, durante o grande toque. Não pronunciou palavra alguma, mas seu olhar parecia dizer-me: “Não o conheço de nome, mas sei que seu coração agora bate em uníssono com o meu… e estou feliz de sentir a mesma alegria junto com você e todas as pessoas que aqui estão, neste ambiente maravilhoso”.

O toque em conjunto começa com o sino da Paulskirche (Igreja de São Paulo); depois, como uma grande reação em cadeia, fazem-se ouvir os outros sinos. Alguns evocam a história da respectiva igreja, como, por exemplo, o da Liebfrauenkirche, onde se venera uma imagem da Imaculada Conceição milagrosamente preservada dos bombardeios aéreos que reduziram o centro de Frankfurt a um triste monte de ruínas, na II Guerra Mundial. Ou o da torre da Catedral de São Bartolomeu, também sobrevivente da mesma catástrofe.

Em determinado momento, quando os toques vão-se irradiando pela cidade, ouve-se distintamente o som do “Glorioso”, como é chamado o sino principal da Catedral: dotado de proporções germânicas, ele pesa nada mais nada menos do que 25 toneladas, e sua poderosa “voz” supera a de todos os outros. Diante da Catedral, uma enorme multidão assiste, encantada e em silêncio, a essa apoteose dos sinos. O sol então já se pôs, vai entrando a noite. É mais um Natal que todos vão viver juntos. “Süßer die Glocken nicht klingen, als zu der Weihnachtszeit… ” – “Os sinos nunca tocam tão docemente como no tempo de Natal…” (Revista Arautos do Evangelho, Dez/2006, n. 60, p. 48 à 51)

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