A Fé nos traz uma grande esperança: no final de tudo, está Cristo, Salvador da humanidade. Ele também está conosco agora e nos acompanha nos caminhos da vida.
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo
I – Reino de Deus, supremo bem do homem
A Solenidade litúrgica de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, no encerramento do Ano Litúrgico, nos faz olhar para o que nos diz respeito no profundo futuro de Deus. No final de nossa vida, que haverá ainda? No final do peregrinar do povo de Deus pela História, que haverá ainda? O que sobrará de todos os projetos humanos, no final de tudo?
Ele é nosso Rei, Senhor e Juiz
Conta-nos a Fé cristã que há uma grande promessa, uma esperança segura, o desfecho redentor de toda realidade humana transitória e frágil: no final de tudo, está Cristo, Salvador da humanidade, que também já está conosco agora e nos acompanha nos caminhos da vida. Com o título de Senhor, ou Rei, afirmamos com São Paulo que Deus entregou todas as coisas nas mãos de Cristo Salvador, para que restaure a obra de suas mãos, decaída e corrompida pelo pecado do homem, e lhe restitua a grande dignidade que o Criador lhe imprimiu.
No final, todas as coisas serão submetidas ao senhorio de Cristo, Senhor do mundo e Senhor da Igreja; aquilo que está submetido à lei do pecado, será resgatado e dignificado pelo dom da Redenção; até a morte será vencida e haverá vida para sempre (cf. I Cor 15, 20?26).
No entanto, isso não se dará sem a livre participação do homem: “Deus, que te criou sem ti, não te salvará sem ti”, dizia Santo Agostinho. No Domingo de Cristo Rei, a Igreja proclama o Evangelho do grande julgamento (cf. Mt 25, 31?46); Aquele que é nosso Senhor e Rei do universo também é nosso Juiz. A Ele, devemos prestar contas de nossa vida, do bem ou do mal que praticamos. Jesus coloca todo o destaque no “exame” que teremos que prestar sobre a prática das obras de misericórdia para com o próximo: “Todas as vezes que fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a Mim que o fizestes” (Mt 25, 40).
Temos todo o tempo da vida para nos preparar bem para esse grande e definitivo encontro com Jesus, o Rei-Salvador. Não haverá motivo para desculpas de última hora, pois Ele mesmo nos preveniu sobre nossa prestação de contas. Cada dia, temos a oportunidade de praticar as obras de misericórdia esperadas pelo grande Juiz.
Estar com Deus é a felicidade completa do ser humano
A festa solene de Cristo Rei nos leva a refletir sobre a realidade do Reino de Deus, ou também Reino de Cristo. Que tipo de realidade será? Alguém se perguntará se vale a pena esperar pelo Reino de Deus, se isso traz esperança ou alguma compensação. Na nossa mentalidade imediatista e utilitarista, queremos ter a certeza da vantagem, antes de nos movermos para algum projeto ou esforço…
É certo que haverá vantagens! São Paulo, mais uma vez, nos ensina que “Deus será tudo em todos” (cf. I Cor 15, 28). Ter Deus como supremo bem não é coisa pequena! É a realização plena de todos os nossos anseios mais profundos! Estar com Deus é a felicidade completa do ser humano. O Reino de Deus consiste, portanto, nesse estar com Deus e saciar para sempre a incontida sede de plenitude e de felicidade, que trazemos no coração.
“O Reino de Deus já está no meio de vós”
O Reino de Cristo e de Deus é feito só de coisas boas: “Reino eterno e universal; Reino da verdade e da vida, Reino da santidade e da graça, Reino da justiça, do amor e da paz” (cf. Prefácio da Missa de Cristo Rei). O Reino de Deus, portanto, é a realização inequívoca da justiça, do amor e da paz, que não se alcançam plenamente neste mundo. Não seria pensável que o ódio e a violência, a maldade e a injustiça, a prepotência e a falsidade tivessem a última palavra sobre nossa existência!
O Reino de Deus torna-se presente já neste mundo quando acontece a luta e a vitória contra o “antirreino”; Jesus ensinou: “o Reino de Deus já está no meio de vós”, e que ainda “sofre violência” e até mesmo rejeição. Portanto, esta vida é o tempo de acolher o Reino de Cristo e de Deus, aderindo aos bens e valores do Reino de Deus. Aqui se decide a sorte do grande julgamento final.
II – Cristãos leigos: discípulos do Reino de Cristo
A Solenidade de Cristo Rei, no Brasil, também é comemorada como o Dia do Leigo. Os leigos são todos os batizados, que sem serem sacerdotes ordenados ou membros de Congregações e Institutos de Vida Consagrada, formam o imenso povo de Deus que é a Igreja.
Chamados a crescer na vida cristã
Os batizados em Cristo (“mergulhados” em Cristo) foram agraciados pelos dons da salvação e da vida nova, que Deus concede a todos os que acolhem na fé o seu Filho Jesus Cristo. Tornam-se, assim, discípulos do Reino de Cristo e de Deus.
Todos os batizados, enquanto vivem neste mundo e esperam a realização plena das promessas de Deus, são participantes da missão que Jesus Cristo confiou à sua Igreja: “Vós sereis minhas testemunhas”.
Por isso levam o nome de cristãos, para serem identificados com Cristo; e participam da missão de anunciar a todos o Evangelho, de muitas maneiras. São chamados também a conformar a própria vida aos ensinamentos do Evangelho de Cristo e a crescer na vida cristã, para produzir os frutos da fé.
O Papa Francisco, na Exortação Apostólica Evangelii gaudium (A alegria do Evangelho, n.180), lembra que a vida cristã não se resume numa série fragmentária de “boas obras”, mas em abraçar a “proposta do Reino de Deus”: em outras palavras, em tornar-se discípulos do Reino de Deus (cf. Lc 4, 43).
Missionários no meio do mundo
Portanto, os batizados são chamados a abraçar em tudo o Reino de Deus, tendo sempre diante de si o Reino de Deus, como referência e critério maior para tudo o que fazem e pensam: “Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo” (Mt 6, 33).
Os cristãos leigos e leigas são os missionários do Reino de Deus no meio do mundo, onde vivem, trabalham, se relacionam e exercem suas múltiplas responsabilidades. Que o Espírito de Cristo os ilumine e fortaleça em sua missão! Folheto litúrgico “Povo de Deus em São Paulo”, 23/11/2014 – Revista Arautos do Evangelho, Janeiro/2015, n. 157, p. 36-37