Triste é ver aqueles que caminham sem um objetivo em sua vida. Um propósito é que torna os seres humanos grandes, e todos os feitos impressionantes são realizados tendo em vista uma meta. Mesmo um inventor que acidentalmente descubra alguma nova propriedade da matéria, no fundo, tinha em vista um objetivo. Para o cristão, a meta de sua vida já estava traçada antes mesmo de ser concebido no útero materno: salvar a sua alma no serviço a Deus. Este é o mérito mais enlevado, a glória mais certa. Porém, com nossas forças, comprovamos que não somos capazes, e é por isso que o Senhor estimula especialmente a virtude da esperança em seus filhos: os versículos e salmos aclamam o homem que põe sua confiança em seu Deus.
Porém, neste contexto, qual a diferença entre a esperança, uma das virtudes teologais, e a virtude da confiança, narrada nas Sagradas Escrituras? Seriam, por acaso, uma só e mesma ação? Ou teriam um significado completamente distinto? É o que nos propomos a esclarecer neste artigo.
Sendo uma componente das virtudes teologais, fé, esperança e amor, compreende-se que a esperança é um primeiro e obrigatório degrau na vida do ser humano. Como dito anteriormente, nem mesmo o pecado mortal a corrompe: sempre resta uma chama de fé e esperança, onde atuam as graças do arrependimento. Ser esperançoso é, pois, aguardar o cumprimento da meta, das promessas de Nosso Senhor: se Ele mesmo disse que seria nossa recompensa demasiadamente grande, quem de nós poderia duvidar? Por acaso mentiria ou exageraria aquele que é a Verdade? Portanto, nosso papel é aguardar, com ajuda da fé, este prêmio, imerecido, mas que Ele nos concedeu em sua agonia na Cruz.
A virtude da esperança nos dá forças contra a nossa própria fraqueza, em primeiro lugar. Os maus pensamentos que nos assaltam, a fragilidade de nossa condição ao corresponder às graças, as tentações que irrompem pelo trabalho do maligno, contra todos continua forte a esperança. Em um segundo momento, a esperança também nos auxilia contra a maré desfavorável da vida. Quem nunca perdeu um ente querido, ou sofreu um revés doloroso que foi consolado pela esperança? Ela nos narra um mundo perfeito, o Paraíso, onde não haverá mais sofrimento ou privação, e onde todos nos encontraremos e conviveremos com a felicidade eterna, caso tenhamos sido fiéis à promessa.
Qual seria o conceito de confiança, então? É o próprio São Tomás de Aquino que nos responde: “uma esperança fortificada por uma sólida convicção”. (Summa Theologiæ, II-IIae, q. 129, art. 6 ad 3). Isto quer dizer que a confiança é um segundo passo na vida espiritual, uma forma de evolução da esperança em grau e intensidade: aquela é o desenvolvimento pleno desta.
De modo prático, a confiança toma um ar ativo, enquanto a esperança é mais passiva; não apenas aguardamos a promessa se realizar, mas lutamos pela sua realização. E em momentos onde parece que a própria esperança se acaba, a confiança continua a se afirmar. Podemos dizer que a confiança é sim a esperança multiplicada pela esperança. Ela se manifesta na obra de muitos santos, exímios praticantes da virtude. Santo Afonso, por exemplo, disse: “Quem reza, se salva; quem não reza, se condena”. Percebemos que ele não fala sobre rezar mal, ou rezar pouco; ele é claro em sua confiança: pediu, o Senhor atenderá e cumprirá sua promessa. Outro santo que esbalda confiança é São Bernardo, em sua oração Lembrai-vos, onde ele afirma: “Lembrai-vos, minha Mãe, que nunca se ouviu dizer que alguém tenha reclamado o vosso socorro e fosse desamparado. Animado eu, com igual confiança…”, ou seja, para ele não há possibilidade de Maria Santíssima não atender.
A própria Virgem praticou esta confiança no Evangelho. Nas bodas de Caná, ao avisar seu Divino Filho que o casal já não possuía mais vinho, recebeu a resposta: “Ainda não é chegada minha hora”. Qual foi sua atitude, então? Parou os serventes e lhes avisou: “Fazei tudo o que Ele vos disser”. (Jo 2, 1-11) Não parou para se perguntar se haveria o milagre; Nossa Senhora foi direto instruir como deveriam operar.
Quando tudo parece desordenado, ou perdido, ou impossível, é aí que nossa esperança está sendo testada para transformar-se em confiança. É muito fácil confiar quando está tudo bem, como já dizia um escritor famoso: “É só belo crer na luz na mais profunda noite”.
É só na aparente desordem, na aparente confusão, na aparente quebra de tudo aquilo que para nós é sinal de vitória que a verdadeira confiança nasce. E dramas há para todos os tipos: não é porque a consequência na vida não seja tão drástica que um sofrimento é menos doloroso de ser vivido. Lembremos que as perspectivas podem tornar uma pequena dor em uma grande desolação, e também para isso serve a confiança.
Portanto, hoje é dia de pedirmos a Nossa Senhora, Ela que é a Mãe da confiança, uma imperturbabilidade nos acontecimentos fruto de uma crença que não duvida nunca. Isso não significa desprezar suas próprias dores; pelo contrário, é entender ainda mais que o sofrimento é passageiro e que, por detrás das nuvens, o Céu é sempre azul. No Livro da Confiança, do Padre Thomas de Saint Laurent, encontramos esta bela introdução: “Voz de Cristo, voz misteriosa da graça que ressoais no silêncio dos corações, vós murmurais no fundo de nossa consciência palavras de doçura e paz”. Façamo-las nossas a partir de agora.