Um dos títulos mais excelsos que Maria Santíssima poderia receber é o de Mãe da Divina Graça. É por isso que, na ladainha lauretana, a invocamos como “Mãe da Divina Graça” logo após os títulos de Mãe da Cristo e Mãe da Igreja. O que significa, porém, tal esplendor na ação de Nossa Senhora? E para nós, seus filhos, o que quer dizer termos n’Ela a rainha das graças de Deus? É o que veremos hoje, neste artigo para homenagear Nossa Senhora das Graças, no dia 27 de novembro.
Antes de entendermos a relevância de Nossa Senhora, precisamos compreender a relevância do título que Ela recebe. São Tomás de Aquino nos diz que uma gota de graça vale mais do que toda a criação inteira. Por quê? A graça, na teologia, é definida como uma participação na vida de Deus. Por Ela, somos transformados em deuses, no seguinte sentido: ao recebermos a graça, começamos a participar da natureza divina por adoção, ou seja, podemos ser chamados de filhos de Deus e coerdeiros do Céu.
A graça age em nós, dando-nos suporte para praticar o bem sobrenatural: infelizmente, nossas intenções não são puras o suficiente para que pratiquemos o bem estavelmente, sem a ajuda da graça de Deus. Dependendo do dia, de nossa situação psicológica e física, até podemos fazer um ato de generosidade; mas, se não fosse a graça de Deus, nós não conseguiríamos manter esse ato até tornar-se um hábito, e realizá-lo de maneira pura, sem que em um algum dia ele seja manchado pelo interesse ou outro vício.
Por isso que as virtudes que possuímos, o bom caráter que venhamos a desenvolver e as boas ações que pratiquemos são fruto da graça divina que cai em nós, como um celeste orvalho. Não tenhamos ilusão, pois no Evangelho vem dito: “o meu pai que está no Céu faz chover sobre bons e maus”, o que significa que todos, sem exceção, são banhados pela graça, e nossa bondade ou maldade vem mediante sua aceitação ou rejeição.
Em 1830, na França, Maria Santíssima apareceu para uma santa freira, Catarina Labouré, e lhe fez um pedido: que se cunhasse uma medalha que instaurasse a devoção ao título de Senhora das Graças. A Virgem ainda fez uma série de promessas àqueles que portassem piedosamente sua medalha, e que concederia a estes, se a levassem com devoção, a salvação eterna, o maior de todos os prêmios.
Os anos se passaram e hoje a aparição de Nossa Senhora das Graças figura ao lado de outras duas: Lourdes e La Salette. Há um paralelo inicial entre as três que é a prova do dogma da Imaculada Conceição, mas ainda existem outras tantas teorias sobre as revelações misteriosas que a Mãe de Deus nos fez. Porém, o que mais nos importa aqui, neste momento, é percebermos que numa época de grande tristeza para Deus, pois o pecado e a religião caíram na banalidade, Nossa Senhora nos procura com um empenho que raramente vimos na História: 3 grandes aparições num intervalo de 30 anos.
Podemos dizer, portanto, que a devoção que veio implantar através do seu título, Nossa Senhora das Graças, envolve essa grande manifestação de Maria na vida de todos nós.
Deus quis precisar de Maria na Encarnação, e quer precisar d’Ela na salvação individual de cada ser humano, é o que nos diz São Luís Grignion no começo de seu Tratado da Verdadeira Devoção. Mesmo sem realmente necessitar de sua Mãe, pois é Todo-Poderoso, Ele quis que uma criatura estivesse à frente de sua criação, para servir de santa embaixadora.
Por isso, para que Nossa Senhora pudesse exercer livremente este direito divino, Deus lhe concedeu ser Medianeira de todas as graças. O que quer dizer algo surpreendente: se, em algum momento de nossa vida, executamos bons hábitos, praticamos a virtude e fizemos o bem de forma estável, é porque Maria Santíssima nos concedeu aquela graça. Ela se tornou um divino reservatório: Deus a enche de graças, e estas, a partir d’Ela, transbordam para nós. Esta é a excelsitude do título que Ela recebe: Mãe da Divina Graça. Além de ser a Mãe de Cristo, é através d’Ela que somos gerados para a vida sobrenatural, nos tornamos Filhos de Deus e coerdeiros do Céu. Repetindo: Deus poderia ter feito isso por si próprio, mas Ele quis precisar de Maria. Que dignidade!
Se tal é a nobreza de seu título, porque Ela nos precisou lembrar, com tanto amor e tanta presteza, no século XIX? Ainda mais se considerarmos que este aviso se completa com as aparições de Fátima, unindo o século XX a esta predileção? Nossa Senhora não está alheia aos planos de Deus. Mais ainda: seu coração está unido ao de seu Filho, ao que São Julião Eymard exclama: “Sagrado Coração de Jesus e Maria!”. Então, se tal foi sua veemência em nos alertar de que precisamos d’Ela e da graça de Deus, é porque os tempos que viriam eram bem tenebrosos.
Guerras, Revoluções, fomes, injustiça, insegurança: são apenas alguns dos males que viemos aprendendo lentamente a conviver, a achar como o novo normal. Com certeza Maria Santíssima via isso e foi nesse intuito que Ela nos alertou: “Eu sou a Mãe da Divina Graça. Vinde a mim, e eu os transformarei”. Mais do que em outras épocas, Ela veio nos dar um suave puxão de orelha, e voltar nossos olhos para o Céu.
Que no dia de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça, possamos ser mais fiéis a sua voz e escutar com mais atenção seus conselhos; que o divino orvalho, a graça de Deus, nos seja ministrada com mais abundância e que possamos as corresponder com mais ardor; e que a próxima intervenção de Nossa Senhora seja para fundar o seu Reino na Terra, alegrando-se conosco de estarmos com os corações em sintonia.