O mundo atual tem contrastes marcantes.

Para a política, ou o representante deve ser um populista bonachão ou um intransigente impiedoso. Era o que narrava Napoleão: é fácil construir um trono de baionetas, mas o difícil é sentar-se nele.

Assim, parece que ou conservamos uma bondade excessiva ou mantemos uma pose de durão e possessivo.

Nesta perspectiva, parece dar-se o mesmo com o Natal: no presépio, podemos enxergar Cristo como um Rei ou como Menino.

Qual é o mais perfeito: um Jesus que manifesta grandeza ou que floresce em bondade?

A majestade do maior dos Reis

Eu quero começar convidando você, caro leitor, a deixar a sua imaginação voar até a Gruta de Belém, no exato momento do nascimento de Jesus.

Embora deitado em seu presépio e sendo ainda uma criança, aquele Menino possuía maior majestade, força e poder que todos os homens, desde os primeiros até os dos fins dos tempos.

É Ele o Rei de toda a glória, Criador do Céu e da Terra, Deus encarnado como homem, manifestando sua majestade feita de sabedoria, santidade, ciência e poder.

Agora, observe Nossa Senhora aos pés do Menino, também Ela como verdadeira Rainha, com uma dignidade e imponência tais que não Lhe era necessário, de modo algum, nem de joias preciosas nem de tecidos de qualidade para realçar sua realeza.

Para compararmos, conta-se, sobre Santa Teresinha, que ela era tão encantadora e imponente que o pai a chamava de “minha pequena rainha”.

O jardineiro do Carmelo declarou, no processo de canonização, que viu certa vez uma freira, de costas, fazendo alguma tarefa, e essa freira era Santa Teresinha. Então lhe perguntaram:

— Como é que, vendo-a de costas, o senhor sabia que era a Irmã Teresinha?

E o jardineiro respondeu:

— Pela majestade dela, ninguém tinha semelhante majestade!

Se assim era a Santa de Lisieux, o que dizer de Nossa Senhora?

É importante lembrarmos como a majestade do Menino Deus se contrapõe à superficialidade dominante em nossos dias, que tenta tornar opacos os mistérios mais excelentes de nossa fé.

Por isso, no Natal, devemos ver a majestade da Sagrada Família, que transforma, com a irradiação de suas virtudes, uma primitiva gruta num palácio, numa catedral!

O carinho e a inocência do mais querido Irmão

Por outro lado, é preciso também que imaginemos novamente o Menino Jesus na manjedoura, sob o olhar extasiado de Nossa Senhora e de São José, tendo também a cada um de nós bem junto d’Ele, assim como estiveram os pastores e os Reis Magos. Em certo momento, Ele abre os olhos e olha para você.

Seu olhar lúcido, puríssimo e inteligente penetra até o fundo de seu ser, enxergando profundamente as suas qualidades e os seus defeitos. 

Neste momento, com o seu olhar amoroso, Ele toca a sua alma, como tocaria, 33 anos depois, a alma de São Pedro, após Ele O negar três vezes, antes de o galo cantar. Um olhar que o fez chorar amargamente e se arrepender pelo resto da vida.

Esse mesmo olhar provoca em você o arrependimento de seus pecados e faz com que você sinta horror aos seus defeitos. Mas, sobretudo, mostra o amor d’Ele por você, exalta as suas qualidades e recorda a sua condição de filho.

Esse olhar faz você se sentir destinado a um grau de santidade e de perfeição que você mesmo desconhece e até duvida poder atingir, mas que Ele sabe exatamente quando vai se manifestar. 

De repente, por um rogo amável de Nossa Senhora, o Menino sorri e, com esse sorriso, faz a distância desaparecer, o perdão invadir sua alma e algo elevado e sublime o atrair.

Como um bebê, Ele ainda não fala, mas, de alguma maneira, você O ouve pronunciar o seu nome ou aquele apelido carinhoso usado apenas por sua família para se referir a você.

Você vai ouvi-Lo chamar você por esse nome e lhe dizer:  “Eu te quis tanto e te quero tanto! Desejo tantas coisas para ti e perdoo-te tantas outras. Não penses mais nos teus pecados! E, em todas as ocasiões de tua vida, quando tiveres alguma dúvida, lembra-te desta condescendência, desta amabilidade e recorre a Mim, por meio de minha Mãe, que atender-te-ei. Serei teu amparo e tua força; e esse amparo e essa força hão de te levar ao Céu para reinares ao meu lado por toda a eternidade”.

Qual Jesus devemos escolher: o cheio de grandeza ou de bondade?

Para responder a esta pergunta, precisamos esclarecer o que a doutrina chama de “opostos harmônicos”.

Para São Tomás de Aquino, a virtude está no equilíbrio entre o exagero e a falta. Por exemplo, a verdadeira paciência está entre a explosão raivosa do irado e a passividade boba do mole.

Mas, isso não quer dizer que, ao mesmo tempo em que exista a virtude da paciência, não exista a virtude da indignação, que está também no meio termo entre na violência egoísta do orgulhoso e o unanimismo do preguiçoso.

Ambas são virtudes; elas perfazem uma oposição que não contrasta, mas se alinha e se harmoniza face de um mesmo absoluto, a vontade de Deus.

Assim, a grandeza e a bondade são irmãs, feitas para conviver em harmonia na mesma pessoa.

Uma concepção equivocada leva à crença de que quem é majestoso deve ser arrogante e desprezar os outros, e que ao bondoso cabe tolerar tudo e não se opor ao mal nem enfrentar os maldosos.

Não é assim.

O grande sabe respeitar a luz de Deus que cada homem porta, e sabe reconhecer, com admiração, o que cada um tem de mais brilhante, e tratá-lo do mesmo modo.

Por outro lado, o bondoso sabe reconhecer a própria vocação, e como é responsável por fazer sua luz brilhar sobre a Terra, portando-se como tal.

Por isso, grandeza e bondade são opostos harmônicos.

E o Menino Jesus tem em plenitude as duas faces: é Rei, mas é também Irmão. Sabe ver nossos defeitos e não compactuar com eles, mas sobretudo sabe nos dar mais uma chance, e mais uma, e mais uma…

Neste Natal, que reconheçamos no presépio a grandeza do Rei e a bondade do Irmão unidas no mesmo Homem.