Quando falamos em virtudes, podemos dividi-las em dois grupos, o das virtudes teologais: fé, esperança e caridade, e o das virtudes cardeais: prudência, justiça, fortaleza e temperança.
Juntas, elas constituem as virtudes essenciais para a vida cristã, seja em nossos deveres para com o Criador ou para com a criação. Com a virtude da temperança, por exemplo, podemos aliviar a Criação divina de nossa insaciável sede de infinito, e depositá-la acertadamente em seu objetivo final, Deus.
Entretanto, ao cristão, pode parecer que estas virtudes são rígidas, sem flexibilidade, levando-o a pensamentos como: “Sempre devo exercer atos de justiça, mesmo quando existe uma necessidade ou conveniência do contrário?” “É indispensável adaptar minha vida à virtude da fortaleza, cortando amizades ‘a torto e a direito’?”
Para aliviar essa angústia e adaptar as virtudes às vicissitudes humanas, há uma delas que é muito importante: a circunspecção.
O que é a circunspecção?
Circunspecção é a capacidade virtuosa de se adaptar às circunstâncias que regem os atos humanos. Ela está ligada à virtude da prudência, que ordena, com acerto, os meios para o fim. No entanto, vai além dela, permitindo-nos agir com segurança e cautela em situações delicadas e desafiadoras.
É São Tomás quem nos explica: “Pode dar-se que um meio seja, em si mesmo, considerado bom e conveniente ao fim; contudo, por certas circunstâncias que nele concorrem, se torna mau ou não conducente ao fim” (S Th, II-IIae, q. 79, a. 7).
Ou seja, algumas ações podem ser virtuosas em si mesmas, como um ato de amor, de estima, de condescendência. Porém, a alguém que jaz num vício sórdido, como o vício químico das drogas, por exemplo, expressarmos um ato desses pode ser perigoso, pois a pessoa pode se sentir aprovada, não sendo impelida à mudança ou a reconhecer o fundo do poço em que se encontra.
O santo filósofo de Aquino conclui: “Por isso, a circunspecção é necessária à prudência, para que o homem compare os meios, atendendo também às circunstâncias”.
Como praticar essa virtude?
Antes de tudo, a prática da virtude da circunspecção vem de uma vida de oração intensa. Ao nos comunicarmos com Deus, tornamo-nos mais capacitados para discernir quando uma circunstância deve adaptar-se a uma ou a outra virtude nossa.
Por exemplo: um pai de família precisa pedir a Deus a virtude da circunspecção para saber quando deve repreender o seu filho ou quando deve deixar tal situação passar.
Não é que deva ser conivente com um ato ruim, aprovando-o; mas o momento pode não ser o melhor para aplicar uma lição.
Santo Afonso Maria de Ligório conta, em uma de suas obras, que esperou mais de dez anos para repreender um sacerdote por uma certa grosseria que tomou.
No momento, devido à sua circunspecção, Santo Afonso percebeu que corrigi-lo no ardor da situação só provocaria um sentimento de revolta que poderia pôr em risco a salvação do seu discípulo.
Em segundo lugar, precisamos haurir a virtude dos santos, através da leitura de seus exemplos e considerações. É por isso que o cristão precisa manter o hábito de ler hagiografia (a vida dos santos), e fazer, também, outras leituras piedosas.