Santo Inácio de Antioquia olha para o imperador que o contempla de cima de seu palanque. Toda a corte romana, homens que trajavam a púrpura e o ouro, o veem de pé, na arena, tão frágil como qualquer pode estar diante da morte.
Mas, naquele dia, não foi o medo do leão que fez o santo bispo se curvar. Quando o felino avança para Santo Inácio, este o para com um gesto. Transformado em gatinho, o leão espera. O sagrado homem então se levanta, e dá um testemunho que ficaria marcado na História:
“Senhor, assim como o trigo é esmagado para se transformar na Sagrada Eucaristia, assim esta fera triture o meu corpo, por Vós, ó meu Deus!”
Ele, que já tinha escrito aos romanos: “Deixai-me ser alimento das feras, pelas quais me será dado desfrutar a Deus. Eu sou o trigo de Deus: é preciso que ele seja triturado pelos dentes das feras a fim de ser considerado puro pão de Cristo”.
E, declinando perante o leão, deixa este se banquetear em sua carne.
Assim morre o homem de Deus em 110 d.C.
De onde vem tanta força de vontade, tanta determinação que olha a própria morte de frente e a encara, não vacila, a põe em seu lugar, manda-a aguardar?
Foi em Jerusalém que o jovem Inácio cresceu. Foi lá, num dia talvez quente, talvez fresco, que, entrando ele numa sinagoga, ainda mocinho, se punha a admirar um homem que pregava.
E que Homem! Ele ainda não sabia, pois era muito novo, mas este Homem era Deus verdadeiro, o mesmo que ele ouvia contar nos sábados que guiara seus pais pelo deserto, que dera o maná em forma de orvalho e que botara para correr aqueles que faziam mal a seu povo.
Perguntavam a esse pregador, que contava seus 30 anos, quem seria o maior no Reino dos Céus. Inácio não entendeu a questão. O importante era chegar ao Céu, o resto não importava! Como menino ele amava dividir suas coisas com outras crianças, e achava isto a melhor coisa de todas.
Quando ele percebeu, o Homem estava olhando para ele. Parecia ler seus pensamentos. Inácio não sabia o que fazer, ficou ao mesmo tempo feliz, emocionado, em paz, envergonhado, tudo junto!
Ele lhe chamou. Seus olhos o aqueciam. Sua mão o convidava a chegar perto dele. Inácio foi caminhando com seus passos pequeninos, mas certeiros. Estar perto do Homem era o correto, isso o menino sabia.
“E, pondo-a no meio deles, lhes disse: ‘Eu lhes asseguro que, a não ser que vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no Reino dos céus. Portanto, quem se faz humilde como esta criança, este é o maior no Reino dos céus’”. (Mt 18, 2-4).
Os pesquisadores bíblicos dizem que esta criança que Jesus chamou era de fato Santo Inácio de Antioquia, que recebeu o título pois governava esta diocese. Entra sim, estudo, entra sim, nossa fé.
Assim entendemos a força do santo diante do cortejo imperial. O que eram os donos do império perante um filho do Senhor do Universo? O que eram as honras mundanas perante a festa que os Anjos lhe faziam no Céu?
E, na brisa que lhe chegava naquela arena com areias vermelhas de mártires anteriores a ele, Santo Inácio de Antioquia ouviu a mesma voz que anos atrás alertou aos apóstolos, quiçá lhe dizendo agora: “Vem, meu filho, minha criança, chegou a sua hora; Eu lhe aguardo, não tardeis”.
Que leão o seguraria? Que tormento o atrapalharia?
Santo Inácio, rogai por nós, fazei-nos inocentes como você era na Terra, para que possamos alcançar o Reino dos Céus, prometido aos pequeninos.