São Bernardo de Corleone tem uma vida cheia de matizes. Sua história poderia ser uma palheta de um pintor renascentista, tais os contrastes entre os vermelhos e azuis que permeiam seus dias.
Aliás, nascido em pleno Humanismo, no dia 6 de fevereiro de 1605, Bernardo era produto do seu tempo. Forte, vigoroso, musculoso, assustador, nada decente: era o homem de Corleone evitado pelos transeuntes na rua.
Foi o tom de roxo, de roxo inflamado que se seguiu em sua mocidade. Fez-se sapateiro em sua juventude, mas bem depressa quis seguir a carreira das forças armadas, pois gostava de armas e de se sentir poderoso ao portá-las.
Neste roxo encontramos o preto do orgulho, pois uma coisa que agradava extremamente a Bernardo era mandar em seus companheiros.
Ainda dentro do exército, em Corleone, Bernardo atingiu em sua palheta existencial a cor vermelha. Posto em um duelo por egoísmo, por desentendimento frágil, estocou seu conterrâneo no peito.
Desesperado, sendo cobrado pelos seus atos, Bernardo fugiu. Deixou as forças armadas, temendo pela sua vida, ansioso para resguardar sua liberdade. No seu caminho, passou pelo moribundo que agonizava no chão e o deixou lá, ferido e ensanguentado.
Com um ato insensato e aproveitador, São Bernardo se refugiou numa igreja. Naquele tempo, havia uma lei: as autoridades civis não podiam entrar num recinto sagrado e levar um homem a força.
Bernardo estava preso, pois, se desse um passo para fora do templo católico, seria arrastado para a forca, pois crimes de deserção geralmente levavam à morte.
Mas Deus escreve certo, por linhas certas, e nós que lemos torto. Vazio de tudo, Bernardo refletiu. E, naquele silêncio tão azul, a graça tocou seu coração. Chorou, arrependeu-se da vida mundana que levava, quis se desfazer do seu antigo eu.
Pediu perdão a um sacerdote, pediu perdão a lei dos homens. Como não havia resultado em morte o seu duelo, foi absolvido. Bernardo decidiu que, se quisesse ser bom, deveria deixar o rastro de sua má vida para trás.
Assim, saiu de Corleone, foi à Caltanissetta. Entregou-se ao Senhor num convento de capuchinhos, onde aprendeu a guardar o silêncio, a humildade, o dever. Do azul sóbrio e reflexivo, as cores de Bernardo passaram ao suave prata e discreto dourado, pois já era um homem de Deus, e onde tocava, floriam maravilhas.
Porém, sua penitência não deixava de ser intensa. Sentia-se um homem falho, precisava amaciar a carne com sofrimentos. Dormia no chão, apenas por três horas. Era sim analfabeto, pois não teve as melhores oportunidades, mas contemplava os mistérios de Deus em sua fonte, graças ao Espírito Santo que adorava.
Exerceu seu trabalho entre os pobres e doentes por 35 anos. Bernardo não o sabia, mas purificava sua alma com cada gemido que se importava, com cada suspiro diante do santíssimo que dava.
E, numa intensa generosidade, aquela alma de tantas cores atingiu a cor suprema, a cor que é um resultado de todas as outras: o branco. Em 12 de janeiro de 1667, com 62 anos, São Bernardo de Corleone trocou a terra pelo Céu.