Uma "escravidão que liberta" é o que se poderia chamar de uma contradição fragrante, para quem não conhece a doutrina de São Luís Maria Grignion de Montfort.

“Ó Virgem fiel, tornai-me em todas as coisas um perfeito discípulo, imitador e escravo da Sabedoria Encarnada, Jesus Cristo, vosso Filho.” (Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem)

Sempre que se usa o termo escravidão, tem-se a sensação de algo terrivelmente ruim, injusto, opressor. No entanto, existe um outro lado da escravidão que pouco ou quase nunca é observado.

A escravidão opressora e a libertadora

Quando falamos em escravidão, primeiramente precisamos avaliar: escravo de quem ou de quê? Pois, há, de fato, escravidões opressoras e destruidoras, a escravidão ao pecado é uma delas. Há também a escravidão aos vícios, aos apegos, aos afetos abusivos e desordenados, escravidão ao dinheiro, ao ego, ao poder, à fama. E, a pior de todas: a escravidão ao demônio, aquela que possui o maior poder destruidor.

Mas, por mais estranho que pareça, existe uma escravidão boa, uma escravidão que liberta, que salva, que restaura. Esta escravidão põe em pé o que estava caído, que eleva o que estava destroçado, que restaura o que estava corrompido; uma escravidão que fala de amor, quando tudo o mais fala o contrário disso.

As funções do escravo e do senhor

Vamos pensar um pouco nas funções do escravo e do senhor. Ao escravo compete cumprir as tarefas que lhe são determinadas e zelar pelo bem-estar de seu senhor e pelo seu patrimônio. Um escravo é, antes de tudo, uma pessoa de confiança.

E o senhor, ele teria também uma função ou lhe bastaria apenas possuir e usufruir da força, dos serviços ou da inteligência de seus escravos? Em primeiro lugar, o senhor precisa garantir o sustento, a saúde, o abrigo e a segurança de seus escravos, logo, essa relação é uma via de mão dupla, em que ambos dão e ambos recebem.

A escravidão à melhor das Rainhas

Ainda assim, parece ruim? Mas, e quando se é escravo de uma Rainha? E não se trata de uma rainha qualquer, mas da mais rica e mais poderosa de todas as rainhas! E não apenas a mais rica, porém, a mais bondosa, que faz com que os seus escravos participem e usufruam de toda a sua riqueza, de todos os seus bens.

Uma Rainha que ama os seus escravos como filhos e os trata como tal. Vela por eles quando estão doentes, pensa nas suas feridas quando se machucam, faz de tudo para alegrá-los quando estão tristes. Mais ainda, resolve as suas demandas e os seus problemas, cuida dos seus interesses e, aquilo que é muito difícil, envolve em seu manto e leva diretamente ao Rei, para que ele tome as necessárias providências.

Essa Rainha administra o Reino de seu Filho, um Reino em permanente construção. E incumbe a cada um de seus escravos zelar por cada pedacinho deste Reino e de cuidar de seus pares, para que ninguém fique desassistido, para que ninguém fique sozinho, para que ninguém morra de sede e de inanição.

Ela ama seus escravos como filhos

Ela conhece cada um dos seus, melhor do que eles mesmos se conhecem. Ademais, faz de tudo para que se desenvolvam e demonstrem as suas habilidades, para que cada um brilhe com a graça primordial com a qual foi dotado por seu Filho, o Rei dos reis.

E, o melhor de tudo, é que essa Senhora ama os seus escravos. Ama cada um como se seu filho fosse e, na verdade, eles são. Por ser muito rica, o número de seus escravos aumenta a cada dia que passa, mas não porque Ela os adquira com os recursos do Tesouro Real, que tão bem administra, e sim porque eles vêm a Ela com a sincera disposição de servi-La.

A escravidão a Maria

O nome desta Rainha é Maria e, ser seu escravo é experimentar um grau de liberdade infinitamente superior. Ela nos faz desfrutar de uma confiança que é capaz de abalar as estruturas do inferno. Esta escravidão nos dá uma coragem que os alça aos páramos celestiais.

A única exigência que Ela faz é que aqueles que lhe pertencem ostentem uma marca para, em hipótese alguma, serem confundidos com os filhos das trevas. E qual é essa marca? A cruz luminosa que brilha em suas frontes e que os distingue como os escravos da Virgem. Estes são os pertencentes à Maria, os escolhidos da Rainha e os filhos diletos do Rei.

A ventura de pertencer a este séquito de criaturas que escolhem entregar suas vidas, seus bens, seus valores e até mesmo as suas boas ações, passadas, presentes e futuras, a essa Senhora a quem podem, confiantemente, chamar de Mãe, é uma ventura que não conhece quem não A conhece.

Hoje, vivemos uma era de paradoxos: quanto mais as pessoas se dizem livres ou se comportam de modo a ostentar essa suposta liberdade, mais se afundam nos erros, se atolam nos vícios, se submetem aos enganos e se entregam, submissos, às hostes de Satanás. Ao passo que, todos aqueles que, dóceis e humildes, não se envergonham de se declarar cativos, são as únicas criaturas verdadeiramente livres, que percorrem juntas a estrada para o Céu, pois é lá que se encontra a Sede do Reino de sua Senhora, cujos domínios se estendem por todo o Universo e que têm os Anjos como seus primeiros serviçais.