A santidade é para todos? Muitos pensam que não… Santa Teresinha é a prova de que ser santo está ao alcance de qualquer um.
Redação (01/10/2020 08:24, Gaudium Press) Em setembro de 1897, morria, em Lisieux, uma das mais eminentes personagens da história da França. Era, ao mesmo tempo, guerreira, apóstolo, missionária, doutora e mártir.
O mais impressionante é que todas essas qualidades estavam reunidas na alma de uma frágil donzela de 24 anos, que passara toda a sua vida ou na casa de seu pai, ou no apagamento da clausura carmelita.
De dentro de uma vida simples, sem grandes obras exteriores, Santa Teresinha atingiu os mais altos páramos da santidade.
Nasceu em Alençon, no dia 2 de janeiro de 1873, última filha de um casal eximiamente católico.
A primeira infância de Teresa foi extremamente alegre. Era uma menina bastante extrovertida, afável e carinhosa. Contudo, esse período – diríamos, de primavera espiritual – foi logo interrompido…
Sua mãe, Célia Guérin, faleceu quando ela tinha apenas 4 anos e meio! Este fato representou um forte trauma para a criança. A partir dali, seu caráter mudaria consideravelmente, passando a ser tímido, um tanto acanhado e muito sensível. Ela mesma dizia que “chorava não só nas grandes ocasiões, mas também nas pequenas” … Muitas vezes, quando percebia ter causado sofrimento a alguém, caíam-lhe as lágrimas, e quando ela finalmente conseguia consolar-se da própria falta, “chorava por haver chorado”! Seu temperamento era frágil, ela o percebia… e sofria por isso.
Contudo, nenhuma dessas dificuldades diminuiu a meiguice e o bom coração que tinha a menina. Sobretudo, sua extrema generosidade fazia com que ela entregasse a Deus tudo o que Ele lhe pedia. Em certa ocasião, afirmou a respeito de si mesma: “desde os três anos, não neguei nada a Deus”. É de se perguntar: antes dos três anos, haveria alguma coisa que ela pudesse dar? Se houvesse, certamente a teria entregue…
O chamado de Santa Teresinha para a vida religiosa carmelita foi extremamente precoce (desde os dois anos de idade!), contudo, teve ainda de passar por um longo trajeto até poder ingressar na “arca santa”. Ao longo dos anos que precederam seu ingresso no mosteiro, Deus foi pouco a pouco “podando” aquela pequena rosa, exigindo-lhe sucessivas renúncias.
Em novembro de 1877 – ano da morte de Célia –, mudou-se com a família para Lisieux, e ali começou mais diretamente sua formação religiosa.
Na ausência da mãe, quem assumiu o encargo de educar e cuidar da pequena Teresa foi Paulina, a segunda irmã mais velha que seria sua conselheira e confidente a partir de então. Na verdade, quem a havia escolhido por “petite Mère”, Mãezinha, fora a própria Teresa.
Entretanto, novamente a morte vem separá-la de sua protetora. Paulina abandonará este mundo, porém, desta vez sem sair dele. Ela foi a primeira das irmãs a se fazer carmelita.
Teresa alegrou-se enormemente com ingresso da irmã no Carmelo: sua impressão era de que esta havia entrado no Céu! Porém, seu coração arquiafetivo sofreu tanto com o afastamento que abalou sua saúde física! Somente no dia 13 de maio de 1883, os mal-estares a deixaram, de forma miraculosa.
Também miraculosa, aliás, foi a “cura” de sua fragilidade temperamental. Esta deu-se de maneira repentina, no Natal de 1886. Esta última graça, recordava a própria Santa, abriu o terceiro período de sua vida. O mais repleto de consolações e graças do Céu.
Recordemos que a vocação de Santa Teresinha despontou muito cedo. Pois bem, pouco antes dos quinze anos, ela pediu oficialmente para ingressar na clausura. Contudo, esta idade era considerada absolutamente precoce, algo inadmissível para os carmelitas.
A tal ponto a jovem encontrou resistência, que teve de viajar a Roma e recorrer diretamente ao próprio Papa – na época, Leão XIII – a fim de pedir a dispensa.
Quando Santa Teresinha chegou diante do pontífice, embora estando expressamente proibida de dirigir-lhe a palavra, ela não resistiu, e passou a insistir com todas as forças para conseguir a autorização desejada. Esta, porém, tardou ainda um pouco em chegar: somente em abril de 1888, deu-se sua entrada definitiva no Carmelo, onde adotaria o nome de Ir. Teresa do Menino Jesus e da Santa Face.
A comunidade carmelita de Lisieux não era das mais fervorosas… A priora, Maria de Gonzaga – suscetível, autoritária, inconstante – tratou-a com bastante severidade. É preciso dizer que isto acabou por ser proveitoso a Teresa, evitando que ela se tornasse a queridinha da comunidade.
Quanto ao resto de sua vida no Carmelo, o único adjetivo que pode qualificá-la é: exemplar. Cumpriu a Regra com inteira perfeição, o que, para um carmelita descalço, não é dizer pouco… o regime de vida restaurado pela grande Santa Teresa de Ávila era de uma radicalidade extrema!
Mas isso de nada valeria se não se traduzisse em um bom relacionamento com as demais, e neste ponto Santa Teresinha foi também um exemplo. Tratava a todas de maneira equilibrada, não dando largas excessivas a seu afeto. Mesmo suas duas irmãs carnais, que se fizeram carmelitas no mesmo convento, conviviam com ela em perfeita harmonia e caridade, mas não experimentavam um trato especial com relação às demais freiras.
Em 1893 foi nomeada mestra de noviças, função que exerceu até o fim da vida.
A morte de Santa Teresinha só pode ser explicada de maneira sobrenatural.
No dia 9 de junho de 1895, sentiu-se inspirada a se consagrar como vítima. Contudo, ao contrário do comum dos que praticaram esse ato de entrega ao longo da História, não desejava ela consagrar-se para aplacar a justiça divina com relação aos pecadores. Teresinha queria ser vítima ao amor. Ela havia sido a Santa do amor; segundo suas próprias palavras, sua missão era ser, no coração da Igreja, o amor. Assim ela reuniu em si todas as vocações e carismas: amando.
Entretanto, é de se perguntar por que Santa Teresinha se ofereceu. Afinal, se não foi pelos pecadores – ao menos direta e exclusivamente – por quem seria?
É verdade que o Amor por excelência, o Amor pessoal em Deus, é o Espírito Santo, que santifica os membros da Igreja. Quiçá – poderíamos conjecturar – tenha ela se oferecido ao próprio Espírito Santo e, através d’Ele, a toda a Igreja.
Seja como for, seu oferecimento não tardou muito em ser aceito. No dia 14 de junho, enquanto fazia a Via Crucis no coro, recebeu uma graça mística intensíssima: sentiu sua alma ferida, abrasada e submergida totalmente no amor. Parecia que ali a Providência havia atendido seu pedido. Por fim, no dia 3 de abril do ano seguinte, surgem os primeiros sinais da tuberculose…
Santa Teresinha sofreu calada o quanto pôde. Os pulmões e os intestinos estavam afetados. Febre altíssima, sede, chagas na pele.
A priora, de início, pensou não ser nada de grave… e os tratamentos – precários naquele tempo – foram ainda mais sumários do que o habitual para tais casos.
A 30 de setembro, a jovem sofredora pronunciou suas últimas palavras: “Oh… vos amo! Meu Deus… vos amo!”. Teve um êxtase, e faleceu. O amor havia dado o último golpe…
O papel, a força e o alcance da atuação de Santa Teresinha após sua morte têm uma dimensão completamente desproporcional com sua vida. Provam-no sua canonização, realizada após um curtíssimo espaço de tempo, em 1925, com superabundância de milagres. Atesta-o também a gigantesca propagação de sua autobiografia, a “História de uma Alma”, publicada em incontáveis idiomas.
É verdade que sua “pequena via” e a escola da “infância espiritual” – doutrinas que incentivam uma completa entrega nas mãos de Deus enquanto bondosíssimo Pai, sempre disposto a dar o melhor para seus filhos – são tão antigas quanto o Evangelho: “Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele”. (Mc 10,15)
Entretanto, Santa Teresinha parece ter sido escolhida por Deus para reavivar estas verdades nas almas.
Não é verdade que aquela menina cheia de fragilidades, dificuldades temperamentais, incompreensões no relacionamento com este ou aquele, parece alguém normal? Uma pessoa de carne e osso, como qualquer outra?
Pois bem, Santa Teresinha mostrou para os séculos futuros que a santidade não é algo impossível. Trata-se apenas de aceitar tudo o que Deus nos envia, com total generosidade e retidão.
Para ser santo não é preciso ser grande, é preciso amar muito, pois “para o amor, nada é impossível”.
BIBLIOGRAFIA
ECHEVERRÍA, Lamberto (coord.); LLORCA, Bernardino (coord.); BETES, José Luis (coord.). Año Cristiano. Madrid: BAC, 2006, v. 10.
Santa Teresinha do Menino Jesus. OEuvres Complètes. França: Desclée De Brouwer, 1992.